Recibido: 24 de diciembre de 2018; Aceptado: 8 de agosto de 2019
Fatores de risco associados à exposição de adolescentes à violência sexual*
Factores de riesgo asociados a la exposición de adolescentes a la violencia sexual
Risk factors associated with adolescent exposure to sexual violence
Resumo
Objetivo:
analisar as evidências científicas sobre os fatores de risco associados à exposição de adolescentes à violência sexual.
Síntese de conteúdo:
revisão integrativa da literatura, realizada em quatro bases de dados e duas bibliotecas virtuais, sem limites do ano de publicação, utilizandose os descritores: "delitos sexuais", "adolescentes" e "fatores de risco". Utilizou-se, também, a palavra-chave "violência sexual" e equivalentes, no idioma inglês. Na análise dos 22 artigos incluídos, os fatores associados à exposição dos adolescentes à violência sexual foram classificados em "abuso sexual" e "exploração sexual". O consumo de álcool e/ou drogas foi o fator mais evidente, seguido do sexo casual, da baixa escolaridade, da baixa renda, da violência familiar, dos relacionamentos em ambientes virtuais, da estigmatização do trabalho sexual e falta de moradia.
Conclusão:
os fatores apresentados devem ser considerados pela enfermagem para o reconhecimento de adolescentes vítimas de violência sexual, além de contribuir na prevenção de novos casos e na minimização dos efeitos que tal ato pode causar na vida desse público.
Descritores:
Delitos Sexuais, Adolescente, Fatores de Risco, Enfermagem (fonte: DeCS, BIREME).Resumen
Objetivo:
analizar la evidencia científica sobre los factores de riesgo asociados a la exposición de adolescentes a la violencia sexual.
Síntesis del contenido:
revisión de la literatura integrativa en cuatro bases de datos y dos bibliotecas virtuales, sin límite de año de publicación, usando las palabras clave: "delitos sexuales", "adolescentes" y "factores de riesgo". También se utilizó la palabra clave "violencia sexual" y su equivalente en el idioma inglés. En el análisis de los 22 artículos incluidos, los factores asociados con la exposición de adolescentes a la violencia sexual se clasificaron en: "abuso sexual" y "explotación sexual". El consumo de alcohol y drogas fue el factor más evidente, seguido por el sexo casual, baja escolaridad, bajos ingresos, violencia familiar, relaciones en entornos virtuales, estigma del trabajo sexual y falta de vivienda.
Conclusión:
los factores presentados deben ser considerados por la enfermera para el reconocimiento de adolescentes víctimas de violencia sexual, además de contribuir con la prevención de nuevos casos y con la disminución de los efectos que tal acto podría causar en la vida de esa población.
Descriptores:
Delitos Sexuales, Adolescente, Factores de Riesgo, Enfermería (fuente: DeCS, BIREME).Abstract
Objective:
to analyze scientific evidence about risk factors associated with adolescent exposure to sexual violence.
Content synthesis:
review of integrative literature in four databases and two virtual libraries, without limit of publication year, using the keywords: "sex crimes", "teens" and "risk factors". The keyword "sexual violence" was also used. In the analysis of the 22 articles included, the factors associated with adolescent exposure to sexual violence were classified as: "sexual abuse" and "sexual exploitation". Alcohol and drug consumption was the most obvious factor, followed by casual sex, low schooling, low income, family violence, relationships in virtual settings, stigma of sex work and homelessness.
Conclusion:
the factors presented should be considered by the nurse for the recognition of adolescent victims of sexual violence, in addition to contributing to the prevention of new cases and to the reduction of the effects that such an act could have on the life of that population.
Descriptors:
Sex Crimes, Adolescent, Risk Factors, Nursing (source: DeCS, BIREME).Introdução
A violência sexual pode ser definida como todo ato sexual sem o consentimento da vítima ou ações de comercialização e/ou utilização da sexualidade de um individuo mediante qualquer tipo de imposição. Esse tipo de violência pode ser evidenciado em todas as faixas etárias, mas ressalta-se que atinge frequentemente crianças e adolescentes, especialmente do sexo feminino, devido às desigualdades nas relações de gênero e aos valores patriarcais da sociedade, bem como a dominação dos mais velhos sobre os mais novos 1,2.
A adolescência é um período de transição entre a infância e a vida adulta, com faixa etária entre 10 a 19 anos 3. Nessa fase, o indivíduo encontra-se exposto à gravidez não planejada, infecções sexualmente transmissíveis, uso de drogas e atos de violência 4.
A violência sexual infanto-juvenil pode se expressar de diferentes formas e conceitos. O abuso sexual é um tipo de violência que envolve atos ou jogos sexuais praticados por qualquer pessoa contra a criança ou adolescente, por meio de suborno, violência física ou ameaça, almejando o prazer sexual do agressor, podendo ocorrer com ou sem contato físico 2,5.
Outra manifestação dessa violência é a exploração sexual. Esta prática está relacionada com a comercialização sexual por exploradores e clientes dos corpos de crianças e adolescentes, vislumbrando lucros com esse comércio ilegal 2,6-8.
No contexto mundial, a violência sexual continua sendo uma realidade constante na vida de crianças e adolescentes e altamente prevalente em todas as sociedades investigadas, independentemente da condição econômica, social, cultural, religiosa ou étnica. Estima-se que, a cada ano, 12 milhões de pessoas sejam vítimas de tal injúria, 36 % de meninas e 29 % de meninos 9.
No Brasil, a segunda causa de agressão mais comum em adolescentes na faixa etária de 10 a 19 anos é a violência sexual, com 23,9 % das notificações, sendo apenas superada pela violência física, com 63,3 % 10. A violência sexual praticada contra o adolescente é uma problemática grave, que pode comprometer o desenvolvimento das dimensões biopsicossocial, cultural e espiritual ao longo de sua trajetória evolutiva 2,9.
Alguns artigos analisados indicam limitações para se alcançar resultados promissores na diminuição dos índices de violência sexual entre os adolescentes devido à complexidade dos fatores que os permeiam 8-10. Cabe ao enfermeiro desenvolver ações de promoção da saúde do adolescente que contemple estratégias educacionais para oportunizar conhecimentos sobre os fatores de risco associados à exposição de adolescentes à violência sexual, com a finalidade de prevenir e/ou romper esse ciclo de medo e constrangimento da vítima diante de um sentimento de isolamento e despreparo para lidar com esse tipo de ameaça.
Dessa forma, analisar o conhecimento científico sobre os fatores de risco à exposição dos adolescentes à violência sexual, contribuirá na identificação dos meios cabíveis para a prevenção desse agravo, sendo viável a síntese desses dados para o direcionamento do cuidado de enfermagem. Assim, este estudo tem como objetivo analisar as evidências científicas sobre os fatores de risco associados à exposição de adolescentes a violência sexual.
Métodos
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que propõe realizar a síntese e análise do conhecimento científico existente sobre o tema investigado, além de identificar lacunas ainda não vistas que precisem ser aprimoradas com a realização de novos estudos, contribuindo significativamente para prática clínica 11.
Nesta revisão foram utilizadas as fases propostas por Ganong 12: (i) elaboração da pergunta de pesquisa; (ii) seleção dos estudos primários; (iii) identificação das características do estudo e extração dos dados; (iv) avaliação dos estudos primários; (v) análise e interpretação dos resultados e (vi) apresentação da revisão.
A coleta de dados ocorreu em junho de 2019. Com o intuito de ampliar a busca, não foi estabelecido limite temporal para a seleção dos artigos. A pergunta de pesquisa "Quais são os fatores de risco à exposição dos adolescentes à violência sexual?" foi formulada de acordo com o acrônimo pico (P: Paciente, Problema ou Grupo; I: Intervenção; C: Controle ou Comparação e O: Outcomes, Desfecho ou Resultado) 13. Para a presente pesquisa, os seguintes elementos foram avaliados: P: OS adolescentes; I: violência sexual; O: fatores de risco. Não foi utilizado o C da estratégia, pois não ocorreu a comparação entre dois grupos.
A busca, realizada nas bases de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis on Retrieval Sistem On-Line (MEDLINE), Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), SCOPUS e nas bibliotecas eletrônicas Scientific Electronic Library Online (SciELO) e ADOLEC, ocorreu a partir dos seguintes cruzamentos de acordo com os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e os respectivos termos do Medical Subject Headings (MESH): 1°) Delitos Sexuais/Sex Offenses OR Violência Sexual/Sexual Violence AND Fatores de Risco/Risk Factors AND Adolescente/Adolescent 2°) Delitos Sexuais/Sex Offenses or Violência Sexual/Sexual Violence AND Fatores de Risco/Risk Factors. Inseriu-se no cruzamento a palavra-chave "Violência Sexual/Sexual Violence" como sinônimo do descritor Delitos Sexuais/Sex Offenses, adotando-se o conectivo OR e para combinar com os demais descritores, utilizou-se o conectivo AND, pois os descritores publicados no cadastro de DeCS não contemplavam a busca para a elaboração deste estudo.
Incluíram-se artigos nos idiomas português, inglês e espanhol. O artigo estava disponível na íntegra ou foi obtido por meio de comutação na instituição de ensino, com o intuito de evitar que estudos elegíveis fossem perdidos, o que resultaria em viés da seleção. Com o escopo de ampliar a busca, não foi estabelecido um recorte no tempo para seleção dos artigos. Excluíram-se: dissertação, tese, livro ou capítulo de livro, editorial, matéria de jornal, revisão integrativa ou sistemática da literatura, carta ao editor, estudo reflexivo, relato de experiência e estudos que não correspondessem ao objetivo da revisão.
Quanto ao nível de evidências, os estudos foram classificados considerando os critérios que reconhecem os seis níveis: nível 1 - revisão sistemática ou metanálise de ensaios clínicos randomizados controlados; nível 2 - evidências obtidas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado; nível 3 - ensaios clínicos bem delineados sem randomização; nível 4 - estudo de caso-controle e de coorte; nível 5 - revisões sistemáticas de estudos descritivos ou qualitativos; nível 6 - obtido de um único estudo descritivo ou qualitativo e nível 7 refere-se à opinião de autoridades respeitáveis baseada na competência clínica ou opinião de comitês de especialistas 14.
Com o propósito de uniformizar a sequência de descritores e seus cruzamentos nas bases de dados, a busca foi realizada por pares sendo encontrados 22.336 estudos, restando 9892 após a remoção dos artigos duplicados. A totalidade dos estudos encontrados foi submetida à leitura dos títulos e resumos para verificar a coerência com a temática a ser investigada, resultando em 88 artigos. Em seguida, realizou-se a leitura dos resumos para averiguar a consonância com os critérios de inclusão e exclusão, sendo excluídos 41 estudos. Os 47 artigos restantes, nesta etapa, foram submetidos à leitura na íntegra e seleção dos artigos para amostra, resultando em 23 artigos (Figura 1).
Figura 1: Fluxograma baseado no PRISMA 17 para estudos de revisão
Os 23 artigos pré-selecionados foram submetidos ao processo de avaliação do rigor metodológico por meio do formulário padronizado do Critical Appraisal Skills Programme (CASP) adaptado para responder aos estudos selecionados para a presente amostra. O CASP trata-se de check-list com 10 questões, com escore entre 0 a 10. Sendo assim, os estudos foram classificados em dois grupos, conforme a pontuação obtida na aplicação do instrumento: A (6 a 10 pontos) - estudos com boa qualidade metodológica e viés reduzido e, B (no mínimo 5 pontos) - estudos com qualidade metodológica satisfatória, mas com potencial de viés aumentado 15. Nessa etapa, foram excluídos cinco estudos por terem obtido classificação B, sendo a amostra final composta por 23 estudos.
Para a análise e interpretação minuciosa dos artigos selecionados, utilizou-se um instrumento construído e validado, contendo os seguintes itens: nome da pesquisa; autoria; revista de publicação; instituição; ano de publicação; objetivos do estudo; descrição metodológica; características da amostra; nível de evidência; resultados e conclusões 16. Na perspectiva de minimizar os viéses, a extração dos dados foi realizada por dois revisores de forma independente e a resolução das discordâncias ocorreu na presença de um terceiro avaliador.
Resultados
Os artigos incluídos foram publicados entre 2007 e 2019 (18-40), com notoriedade para o ano de 2015, que apresentou 26,1 % (n = 6) 25-29,35 artigos. Quanto ao local de pesquisa, o país predominante foi os Estados Unidos com 36,4 % (n = 8) 20,21,24,25,27,33,37,39,40. Com relação ao idioma 95,6 % (n = 22) 18-30,30-39 foram publicações em inglês, sendo apenas uma publicação em espanhol 30.
A maioria dos artigos possuía abordagem quantitativa 18-21,23-34,36-40 e nível de evidência VI (91,3 %) 18-21,23-30,32-40. Todos os artigos utilizaram um ou mais instrumentos para a coleta de dados, sendo que 91,3 % fez uso de questionário e os demais, entrevista semi-estruturada.
As evidências apresentadas pelos artigos, ao abordar os fatores de risco associados à exposição à violência sexual pelos adolescentes, apresentaram especificidades que distinguem a classificação da violência sexual, como abuso ou exploração sexual. Para os resultados da presente revisão integrativa, resultaram 23 artigos que atenderam aos critérios de seleção estabelecidos. Foram exibidos dados referentes à caracterização dos estudos como também os fatores de risco associados à exposição de adolescentes à violência sexual nas situações de abuso e de exploração sexual (Tabelas 1 e 2).
Tabela 1: Descrição dos artigos selecionados e dos fatores de risco associados ao abuso sexual. Recife, PE, Brasil, 2019
Fonte: dados da pesquisa.
Tabela 2: Descrição dos artigos selecionados e dos fatores de risco associados à exploração sexual. Recife, PE, Brasil, 2019
Fonte: dados da pesquisa.
Quanto à questão do gênero, identificou-se uma similaridade entre os 23 estudos, sendo a mulher a principal vítima da violência sexual na adolescência. Esteve presente em 56,5 % (n = 13) 18,22,24-26,29,31,32,34-37,39 dos artigos, com a descrição dos efeitos devastadores nas dimensões física e mental, em curto e longo prazo. Também relatam como elementos protetores a efetivação de políticas públicas e reconhecimento por parte das vítimas das diferentes formas de violência sexual para uma ação protetora eficaz 26-28,32,39.
O uso de álcool e/ou drogas apresentou-se como fator de risco em 82,6 % (n = 19) 17-25,27-31,34-36,38,39 dos estudos analisados, sendo considerado um elemento predisponente para ocorrência da violência sexual em adolescentes. Ressalta-se ainda que os adolescentes, ao consumirem álcool de modo abusivo, apresentam alteração no seu juízo crítico, ampliando a exposição ao risco para diferentes formas da violência sexual 25-28.
Destacam-se também, entre os principais fatores de risco, a exposição do adolescente à violência sexual: sexo casual 30,4 % (n = 7) 21,24,29,30,33,34,38, baixa escolaridade 26,1 % (n = 6) 25,29,31,35,36,38, baixa renda 26,1 % (n = 6) 25,29,32-36, o adolescente espectador e/ou vítima de violência familiar 26,1 % (n = 6) 18,19,24,25,31,38, relacionamentos em ambientes virtuais 17,4 % (n = 4) 24,27,34,38 e estigmatização do trabalho sexual 13,0 % (n = 3) 33,36,38.
Diante das evidências científicas que delimitam os fatores de risco associados à violência sexual de adolescentes, percebe-se que a educação em saúde deve ser utilizada no empoderamento dessa população para o reconhecimento imediato desses fatores e, assim, resguardar os direitos dos adolescentes, destacando o papel da família, escola, sociedade e profissionais de saúde como responsáveis em compor uma rede de proteção à exposição de situações de risco à violência sexual em adolescentes 23,24,26,30.
Discussão
É importante compreender o contexto da violência sexual contra o adolescente, o que requer o conhecimento de aspectos culturais, estruturais, sociais, econômicos, psicológicos e físicos diante da exposição dessa população aos fatores de risco mais prevalentes.
No mundo, o abuso sexual contra crianças e adolescentes apresenta índices de 8-31 % para o sexo feminino e 3-17 % para o sexo masculino, sendo considerado o sexo feminino com três vezes mais chances de sofrer essa injúria 18. A ocorrência da violência sexual é marcada pela desigualdade, colocando as mulheres como as principais vítimas dessa violação de direitos 19,23,25-27,29,30,32,33,35-38. Esses achados fortalecem o estigma da submissão feminina ao homem e falta de informação dessas adolescentes sobre seus direitos e questões sociais que envolvem o seu cotidiano.
O uso de álcool e/ou drogas foi destacado como fator de risco mais presente para os tipos de violência sexual em diversos países, caracterizando um problema mundial, mostrando que sua utilização de forma abusiva pode levar os indivíduos a apresentarem alterações comportamentais, aumentando os riscos à exposição à violência. O referido achado pode estar relacionado à redução da percepção do mundo ao seu redor, concebendo maior vulnerabilidade ao adolescente 18-26,35.
Entre os fatores predisponentes para o abuso sexual, observou-se o sexo casual, caracterizado por não apresentar vínculo emocional, concorrendo para a execução do ato sexual sem o consentimento da vítima. O ato sexual praticado sem anuência da vítima é marcado por agressões, acarretando efeitos imediatos e tardios, como abortamento, exposição a infecções sexualmente transmissíveis, depressão, ansiedade, isolamento social, entre outros 23,31,32,40. Na exploração sexual, esse fator ainda é mais evidente, pois a vítima é visualizada como uma mercadoria que foi comercializada sendo, na maioria das vezes, submetida a situações que infringem seus direitos 23,35,36,41-44.
O envolvimento de adolescentes com sexo casual pode estar associado à obtenção de fins lucrativos, assim como ocorre com o trabalho sexual. A estigmatização do trabalho sexual retrata a difícil realidade dos adolescentes que são vítimas da exploração sexual ao serem expostos a esta atividade com a finalidade de obtenção de lucros por terceiros 27,28,37,36. A prostituição carrega consigo o preconceito e a desvalorização, por ser considerada um comércio de pessoas que não merecem qualquer tipo de respeito pela oferta dos serviços sexuais, resultando em atos violentos com forte impacto na saúde nessa população 24,45-48.
A exploração sexual de adolescentes apresenta íntima associação com situações de vulnerabilidade no contexto familiar. A violência intrafamiliar esteve presente nos estudos como fator instigante na violação dos direitos do adolescente. A exposição à violência no seio familiar é comum entre os adolescentes, com destaque para famílias com menor poder aquisitivo que se encontram propensos a testemunhar e/ou experimentar esse descumprimento dos direitos da criança e do adolescente 32,39,49-53. Ao indagar a respeito do motivo que leva os pais ou responsáveis a não exercerem sua função de proteção, observa-se que as ocorrências desses delitos podem ser justificadas pela tolerância social a esse tipo de fenômeno, pois a maioria dessas situações são negligenciadas, seja o adolescente como espectador ou vítima 25,26,32.
A situação de extrema miséria marcante na existência de muitos adolescentes que precisam lidar com a não satisfação de suas necessidades básicas, inclusive com a ausência de segurança de um lar, passam a assumir uma postura de submissão e exposição em busca de manter sua sobrevivência, como evidenciado por adolescentes em situação de rua 33.
Ao considerar as situações de vulnerabilidade do adolescente à violência sexual, emerge a tecnologia como aspecto facilitador para a prevenção de situações que levam a essa injúria. Os avanços tecnológicos ampliaram os modos de interação utilizados pelos adolescentes, identificando o ambiente virtual como forma de comunicação com o mundo. Os adolescentes em descobertas e exploração da sexualidade vinculam ao uso da internet as possibilidades de ampliar vivências e relacionamentos românticos. No entanto, o meio virtual mostrou-se um ambiente de risco para exploração sexual, diante da ingenuidade dos adolescentes para lidar com pessoas desconhecidas 25,28,34,35.
A busca por relacionamentos no meio virtual pode estar associada a relações familiares disfuncionais, deixando os jovens em situações vulneráveis, ao recorrer à internet como uma estratégia para a autoafirmação pessoal 35, tornando clara a importância dos pais na manutenção de uma relação saudável e de proximidade com os filhos, inclusive na educação e supervisão quanto ao acesso e comunicação no ambiente virtual.
Na exploração sexual do adolescente, o nível de educação é um fator diferencial na ocorrência desse agravo, sendo reconhecido nos estudos que condições propícias de escolaridade constituem um fator protetor 26,30,34,36,37. Nas discussões quanto ao acesso à escolarização, é referido que o ensino médio completo é essencial, pois o indivíduo possui uma maior consciência crítica com conhecimento de seus direitos perante a legislação. Um maior nível de instrução contribui para maiores oportunidades de trabalho com possibilidade e renda proporcional a suas necessidades, reduzindo as chances de residir ou comercializar nas ruas, visto como fator agravante para atos de violência 26,30,34,36,37.
Emerge a necessidade de conhecer os fatores de risco e vulnerabilidades que afetam os adolescentes e oportunizar discussões no cenário escolar para o compartilhamento dos conhecimentos e experiências na perspectiva de uma formação cidadã 18,53,54.
A exposição à violência sexual pode levar ao baixo desempenho escolar e, consequentemente, ao uso de álcool e/ou drogas. O enfermeiro, em articulação com outros profissionais da saúde e da educação, deve reconhecer o contexto no qual o indivíduo está inserido e intervir positivamente nos aspectos que levam à transgressão dos direitos 54,55. A enfermagem possui papel central na execução dessas ações junto à escola, possibilitando uma comunicação estratégica interdisciplinar que envolva os setores da saúde e da educação 2.
A interrelação do início precoce do abuso e/ou exploração sexual persistente sugere que a educação e o apoio familiar foram eficazes em algumas situações para a descontinuidade dessas injúrias, mas em outros casos a família pode ser considerada um fator desencadeador desse processo de violência sexual 30,18. Os adolescentes, ao residirem com os pais ou responsáveis, estão sob supervisão familiar sendo considerado um fator de proteção, já que nessa visão os adolescentes se tornam menos suscetíveis à violência sexual 18,56-59. No entanto, os próprios pais podem ser os agressores estabelecendo uma relação de poder sobre a vítima, inibindo o processo de denúncia permitindo, dessa forma, que a violência sexual seja persistente contra esse jovem 59,60.
Na realidade atual, ao analisar os estudos da presente amostra, observou-se que, mesmo identificando diversos fatores de exposição do adolescente à violência sexual, há lacunas como a ausência de relacionar o gênero e a predisposição a essa violação de direitos. Este tema é de fundamental importância em um momento de discussão e de enfrentamento à intolerância diante da diversidade atual mundial.
Sendo assim, existe a necessidade de outras pesquisas que avaliem aspectos mais complexos relacionados aos tipos de violência sexual.
Esta revisão apresenta como limitações o baixo quantitativo em estudos experimentais ou quase-experimentais envolvendo a temática, o que delimitou a prática baseada em evidências. No entanto, os tipos de estudos encontrados possibilitaram o reconhecimento dos principais fatores de risco à exposição do adolescente à violência sexual.
Conclusões
Os resultados deste estudo evidenciam que os principais fatores associados à exposição dos adolescentes à violência sexual foram: uso de álcool e/ ou drogas; sexo casual; adolescente espectador ou vítima de violência familiar; baixa renda; falta de moradia; baixa escolaridade; relacionamentos em ambientes virtuais; estigmatização do trabalho sexual e sexo feminino como público mais acometido, possibilitando apreender a complexidade das demandas de saúde e cidadania que envolvem esse grupo populacional.
Observou-se que existe uma diversidade de fatores relacionados à violência sexual, embora alguns sejam mais presentes no contexto estudado. No entanto, esses com aparições esporádicas não devem ser menosprezados, pois, dependendo da localidade, podem ser mais comprometedores que os mais prevalentes, tornando evidente a necessidade de ações articuladas de educação em saúde que contemple os mais diferentes aspectos para promoção da saúde desses adolescentes.
Todos os fatores de exposição devem ser considerados pelo enfermeiro e demais profissionais que lidam com os adolescentes nas instiutições de saúde, na escola e/ou em outros locais, de forma a adotar medidas de prevenção, minizando os efeitos devastadores que a violência sexual poderá ocasionar ao longo da vida dos adolescentes.
O enfermeiro exerce um papel de interlocutor na promoção à saúde do adolescente, cabendo-lhe desenvolver ações interdisciplinares que propiciem discussões sobre a temática com o propósito de subsidiar a construção de conhecimentos pelos adolescentes, reconhecimento e enfrentamento dos fatores de risco associados à violência sexual.
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