Fuente: Autoría propia
Segregação e acessibilidade ao transporte público por ônibus.
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Segregación y Accesibilidad al Transporte Público por Autobús.
El Caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Segregation and Accessibility to Public Transport by Bus.
The Case of Belo Horizonte/MG – Brazil
Ségrégation et Accessibilité aux Transports Publics par Bus.
Le Cas de Belo Horizonte/MG – Brésil
Daniela Antunes Lessa
Universidade Federal de Ouro Preto
daniela.lessa@ufop.edu.br
https://orcid.org/0000-0002-4856-5671
Ana Paula Vasconcelos Gonçalves
Universidade Federal de Minas Gerais
anapaulavg@ufmg.br
https://orcid.org/0000-0003-1760-8410
Ana Marcela Ardila Pinto
Universidade Federal de Minas Gerais
marardila@ufmg.br
https://orcid.org/0000-0003-2066-0738
Carlos Fernando Ferreira Lobo
Universidade Federal de Minas Gerais
carlosfflobo@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-5368-8879
Cómo citar este artículo:
Lessa, D. A., Gonçalves, A. P., Ardila, A. M. P. y Lobo, C. (2025). Segregação e acessibilidade ao transporte público por ônibus. O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil. Bitácora Urbano Territorial, 35(II): 111-125.
https://doi.org/10.15446/bitacora.v35n2.117282
Recibido: 29/10/2024
Aprobado: 13/08/2025
ISSN electrónico 2027-145X. ISSN impreso 0124-7913. Universidad Nacional de Colombia, Bogotá
[1] Este trabalho foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais, por meio dos projetos: “Acessibilidade e mobilidade espaciais da população idosa em Belo Horizonte e Região Metropolitana” (APQ 409726/2022-2, CNPq) e “Indicadores e diretrizes para a construção de uma política de acessibilidade e mobilidade urbana inclusiva e sustentável da população idosa na Região Metropolitana de Belo Horizonte” (APQ-04270-22, FAPEMIG).
(2) 2025: 111-125
Autores
08_117282
Resumo
A acessibilidade aos sistemas de transporte é uma das condições fundamentais da vida urbana, especialmente em contextos com altos níveis de desigualdade e segregação espacial, como o de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é identificar diferentes agrupamentos espaciais relacionados aos padrões de segregação e associá-los à acessibilidade por ônibus da população do município. Para isso, foram identificados agrupamentos espaciais dos padrões de segregação segundo o Índice Local de Moran, de acordo com os níveis de renda, o índice de acessibilidade (IA) ao sistema de transporte coletivo por ônibus e a correlação entre ambos os índices, por meio de uma regressão geograficamente ponderada. Os resultados gerais indicam a presença de uma correlação espacial positiva. Foi possível identificar quatro clusters espaciais que, ao serem comparados, evidenciam uma possível relação entre renda e acessibilidade ao sistema de transporte por ônibus. As áreas extremas norte e sul do município enfrentam maiores dificuldades de acesso, mesmo sendo áreas de alta demanda por viagens, enquanto as zonas de maior renda apresentam melhor cobertura, o que sugere uma aparente contradição.
Palavras-chave: Desigualdade Social, Transporte Coletivo, Renda, Minas Gerais.
Resumen
La accesibilidad a los sistemas de transporte es una de las condiciones fundamentales de la vida urbana, especialmente en contextos con altos niveles de desigualdad y segregación espacial, como el de Belo Horizonte, capital del estado de Minas Gerais. En este sentido, el objetivo de este trabajo es identificar los diferentes agrupamientos espaciales relacionados con los patrones de segregación y asociarlos con la accesibilidad en autobús de la población del municipio. Para ello, identificamos los agrupamientos espaciales de los patrones de segregación, según el Índice Local de Moran, de acuerdo con los niveles de renta, el índice de accesibilidad (IA) al sistema de transporte colectivo por autobús y la correlación entre ambos índices, a través de una regresión geográficamente ponderada. Los resultados generales indican la presencia de una correlación espacial positiva. Fue posible identificar cuatro clusters espaciales que, al compararse, evidencian una posible relación entre los ingresos y la accesibilidad al sistema de transporte en autobús. Las zonas extremas norte y sur del municipio enfrentan mayores dificultades de acceso, incluso siendo áreas con alta demanda de viajes, mientras que las zonas de mayores ingresos presentan mejor cobertura, lo que sugiere una aparente contradicción.
Palabras clave: Desigualdad Social, Transporte Colectivo, Renta, Minas Gerais.
Abstract
Accessibility to transport systems is one of the fundamental conditions of urban life, especially in contexts with high levels of inequality and spatial segregation, such as Belo Horizonte, the capital of Minas Gerais state. In this regard, the objective of this paper is to identify different spatial clusters related to segregation, patterns and to associate them with bus accessibility for the municipality’s population. To this end, we identified spatial clusters of segregation patterns, according to the Local Moran’s I index, based on income levels, the accessibility index (IA) to the bus transport system and the correlation between both indices, through a geographically weighted regression. The overall results indicate the presence of a positive spatial correlation. Four spatial clusters were identified that, when compared, show a possible relationship between income and accessibility to the bus transport system. The extreme northern and southern areas of the municipality face greater access difficulties, even though they are high-demand travel areas, while higher-income zones present better coverage, suggesting an apparent contradiction.
Keywords: Social Inequality, Public Transport, Income, Minas Gerais
Résumé
L’accessibilité aux systèmes de transport est l’une des conditions fondamentales de la vie urbaine, en particulier dans des contextes marqués par de forts niveaux d’inégalités et de ségrégation spatiale, comme celui de Belo Horizonte, capitale de l’État de Minas Gerais. Dans ce cadre, l’objectif de ce travail est d’identifier différents regroupements spatiaux liés aux schémas de ségrégation et de les associer à l’accessibilité en bus de la population municipale. Pour ce faire, nous avons identifié les regroupements spatiaux des schémas de ségrégation, selon l’indice local de Moran, en fonction des niveaux de revenu , l’indice d’accessibilité (IA) au système de transport collectif par bus (IA) et la corrélation entre les deux indices, à travers une régression géographiquement pondérée. Les résultats généraux indiquent la présence d’une corrélation spatiale positive. Quatre clusters spatiaux ont pu être identifiés qui, une fois comparés, mettent en évidence une possible relation entre les revenus et l’accessibilité au système de transport par bus. Les zones nord et sud extrêmes de la municipalité rencontrent de plus grandes difficultés d’accès, bien qu’elles soient des zones à forte demande de déplacements, tandis que les zones à revenu plus élevé bénéficient d’une meilleure couverture, ce qui suggère une contradiction apparente.
Mots-clés: Inégalité Sociale, Transport Collectif, Revenu, Minas Gerais
Introdução
A partir das últimas décadas do século XX, em um contexto de queda no ritmo de crescimento demográfico das grandes metrópoles do país, os deslocamentos populacionais de curta distância assumem papel preponderante na estruturação do espaço intraurbano. As condições de acessibilidade tornam-se decisivas na dinâmica de organização espacial e constituem o objeto principal dos conflitos sociais, incluindo suas manifestações espaciais, como a segregação. A cidade representa, portanto, o locus da mediação de relações entre processos que modificam o espaço e colaboram para a consolidação de redes densas e articuladas ao longo do território. Torna-se relevante, portanto, investigar de que modo o acesso ao sistema de transporte público por ônibus, principal meio de deslocamento nas grandes cidades brasileiras, pode influenciar as formas de segregação espacial.
O município de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais/Brasil, segundo estimativas do IBGE, abrigava uma população residente superior a 2,31 milhões de habitantes em 2022 (IBGE, 2022). O elevado estoque populacional vem acompanhado de inúmeras precariedades na provisão de acessibilidade e mobilidade urbana. Esse quadro torna-se ainda mais grave se considerarmos o fato de que o transporte individual historicamente foi privilegiado e as parcelas mais vulneráveis continuam sendo preteridas. Ainda que tenha havido queda na participação dos deslocamentos por transporte coletivo entre as Pesquisas Origem e Destino (OD) de 2002 e 2012, o sistema, fortemente centrado no modo ônibus e responsável por atender grande parte da população de menor renda, mantém-se com marcada tendência radiocêntrica e diametral.
Frente a esse contexto adverso, algumas questões quase inevitavelmente se apresentam para reflexão: as desigualdades sociais, consideradas em uma de suas formas espaciais, se manifestam nos diferenciais de acessibilidade ao sistema de transporte por ônibus no caso de Belo Horizonte? Os agrupamentos espaciais apresentam diferenças relevantes de acessibilidade? Considerando essas questões como linhas de reflexão, este artigo tem como objetivo identificar os diferentes agrupamentos espaciais relacionados aos padrões de segregação e associá-los à acessibilidade por ônibus da população do município. Tais agrupamentos serão analisados com base em indicadores de segregação por renda construídos a partir do Índice de Moran Local e no Índice de Acessibilidade (IA) ao sistema de transporte coletivo por ônibus, sugerido por Lessa, Lobo e Cardoso (2019).
A Segregação Social no Espaço Urbano
O fenômeno da segregação urbana representa uma das temáticas mais tradicionais exploradas por pesquisadores de distintas áreas, inclusive da geografia e da sociologia urbana. Autores como Massey e Denton (1988) destacaram a existência de dimensões distintas na organização espacial de diversos grupos dentro de uma mesma cidade, caracterizando diferentes formas de mensurar a segregação e a desigualdade. Neste trabalho retomamos a definição de Le Roux, Vallée e Commenges (2017) de segregação urbana como uma manifestação da distribuição espacial desigual dos grupos sociais no espaço, que está relacionada com a dimensão de agrupamento.
Ao longo do tempo, mudanças significativas podem resultar na configuração de espaços onde se formam agrupamentos populacionais relativamente homogêneos, frequentemente considerados um indicativo de desigualdade. Nesses locais, a distância em relação às oportunidades de emprego, às condições habitacionais e ao acesso a serviços urbanos podem ampliar o padrão de segregação dos indivíduos (Musterd & Ostendorf, 1998).
No caso das cidades latino-americanas, as pesquisas evidenciam o desenvolvimento de fortes processos de segregação com um alto distanciamento entre os grupos sociais no espaço urbano, além da existência de diferenças significativas nos padrões e nos fatores que explicam tal cenário. Estas podem estar associadas ao aprofundamento dos processos de democratização e descentralização política, bem como à melhoria da qualidade de vida em algumas cidades, o que contribui para a configuração de cidades mais heterogêneas. Esse arranjo implica a complexificação do padrão tradicional de centro e periferia, com o aumento de proximidade entre grupos, sem necessariamente uma proximidade social. Como consequência, tem sido observada uma transformação da escala geográfica da segregação, passando da diferenciação de grandes áreas, como municípios, para a configuração de separações entre grupos de escalas menores, como bairros e ruas (Marques, 2012; Sabatini, 2006; Smets & Salman, 2016).
De acordo com Cardoso e Préteceille (2023), os mercados de solo nas cidades latino-americanas produzem áreas de urbanização informal, carentes de serviços e infraestrutura que não se alinham aos padrões normativos das regiões consolidadas, sendo frequentemente desvalorizadas. Nesse sentido, as políticas públicas de habitação podem agravar os padrões de segregação devido à ausência de infraestrutura ou à má localização e qualidade construtiva. Nota-se também a presença de agrupamentos segregados a partir das residências das classes mais privilegiadas, como é o caso frequente da criação de condomínios fechados, que promovem a autossegregação motivados por status social (Sabatini, 2006).
Na América Latina, os habitantes mais pobres geralmente residem em áreas mais distantes dos centros urbanos e enfrentam longas distâncias, tarifas elevadas e deficiências nos serviços de transporte (Hernandez, 2018). Essas distâncias tornam-se ainda maiores quando se considera que a maioria dos deslocamentos é realizada em transporte público, especialmente na América Latina (Guzman et al., 2019).
Apesar da importância do planejamento de transportes na produção do espaço urbano, poucos estudos abordam a relação dos problemas da segregação social e das questões associadas à acessibilidade (Park et al., 2021). A revisão de literatura sobre o tema feita por Liao et al. (2025) reforça esse argumento e ainda mostra que pessoas mais pobres tendem a ter limitado espaço de atividades e, como consequência, uma vida mais localizada em áreas específicas da cidade, ou seja, apresentam níveis mais elevados de segregação. Nesse caso, o transporte é um bem que pode atuar como meio de garantia de acesso às oportunidades disponíveis nos centros urbanos, marcados por sensíveis níveis de desigualdades, uma vez que as camadas de alta renda têm maior margem de escolha, enquanto as mais populares possuem maior limitação de acesso aos diferentes modos de transporte (Cerqueira & Diniz, 2023; Park et al., 2021).
Belo Horizonte constitui um caso específico de análise para a compreensão dos processos de segregação e de acesso ao transporte. Trata-se de uma cidade monocêntrica, cujo sistema de transporte também está organizado com base nesse modelo. As demais áreas caracterizam-se pela deficiência de bens, serviços urbanos e transporte, configurando uma estrutura urbana altamente segregada, o que corrobora com os trabalhos de Haddad (2020) e Cerqueira e Diniz (2023).
Em conjunto, coloca-se a importância de entender: o papel da desigualdade de renda como um dos fatores mais relevantes que incidem na formação de áreas segregadas; e o papel do acesso ao transporte para diminuir as barreiras socioespaciais associadas às formas de segregação residencial. Existem poucos trabalhos preocupados especificamente sobre o acesso aos sistemas de transportes. O menor interesse pode estar associado à indisponibilidade de dados públicos de boa qualidade no Brasil. Poucos municípios possuem pesquisas OD (praticamente restritas às grandes metrópoles) e apenas a partir do Censo de 2010 foram incorporadas perguntas sobre deslocamentos da população. Cabe destacar a primazia de uma visão sedentarista, que valoriza os padrões residenciais, sem reconhecer as dinâmicas de movimento (Sheller & Urry, 2006).
A literatura acadêmica tem reconhecido que o sistema de transportes possui influência direta nos custos de produção, nos fluxos de comércio e na articulação de áreas de mercado, bem como no bem-estar social da população residente. A acessibilidade ao sistema é vista como uma medida complexa (Chen et al., 2017). Não raro, o vasto emprego desse conceito pode induzir equívocos de interpretação (Koenig, 1980). Embora alguns autores reconheçam a importância e complementaridade conceitual, poucos são aqueles que buscaram verificar a real influência de um sobre o outro (Lessa et al., 2019). Algumas definições incluem interpretações como: “o potencial de oportunidades de interação” (Hansen, 1959, p. 4); a facilidade com que qualquer atividade pode ser alcançada utilizando um sistema de transporte específico; a liberdade de decisão dos indivíduos em participar ou não de diferentes atividades; e os benefícios proporcionados por um sistema de transporte associado ao uso do solo (Ben-Akiva & Lerman, 2018;)
A acessibilidade pode, ainda, ser considerada a habilidade de alcançar atividades, indivíduos ou oportunidades, se deslocando aos locais onde essas necessidades estão localizadas, ou entendida como um produto do uso do solo e do sistema de transportes. Enquanto indicador e valor socioeconômico, a acessibilidade permite uma abordagem que ultrapassa o acesso aos sistemas de transporte, considerando os ganhos decorrentes da circulação de mercadorias e pessoas, especialmente em um contexto de elevado nível de pobreza, não desenvolvimento e segregação espacial. A acessibilidade também está especificamente aliada à limitada oferta e integração física e tarifária entre os diversos modos coletivos componentes dos sistemas de transporte tradicionais e alternativos (Bocarejo & Oviedo, 2012).
Essa vasta amplitude conceitual sugere a relevância e abrangência dos indicadores de acessibilidade na atualidade e demonstra diferentes aspectos do transporte urbano. Por um lado, a melhoria das condições de viagem é um reflexo da melhoria nas condições da acessibilidade, uma vez que a infraestrutura de transporte eficiente favorece o acesso aos diversos serviços urbanos. Por outro lado, o desenvolvimento das redes de transporte também induz a expansão urbana e a criação de áreas periurbanas de baixa densidade, o que pode favorecer a deterioração da própria acessibilidade. Dessa forma, embora seja comum estabelecer um vínculo positivo entre acessibilidade e integração espacial – entendida como o oposto da segregação espacial –, as diferenças na mobilidade individual nem sempre são fáceis de interpretar em termos de integração ou desigualdades sociais. Ainda que os estudos desse campo considerem as desigualdades, nem sempre são medidos os indicadores de acesso ao transporte em relação às formas de dissimilaridade e de proximidade das classes sociais.
É na integração desses conceitos que consideramos relevante a contribuição do presente trabalho. O caso de Belo Horizonte permite a elaboração de um diagnóstico e prognósticos que oferecem informações úteis à gestão e ao planejamento do sistema de transporte municipal e metropolitano. Também possibilita a avaliação de discrepâncias entre a utilização do sistema de transporte por ônibus e a acessibilidade disponível em cada unidade espacial analisada. Tais dados podem ser úteis à administração pública, no sentido de subsidiar a formulação de políticas e medidas preditivas e propositivas que visem à tomada de decisão mais acertada.
Materiais e Métodos
Para integrar a análise da segregação urbana por renda e o acesso ao transporte público, utilizou-se um conjunto de conceitos, indicadores e métodos de medição. Em relação ao conceito de acessibilidade, consideraram-se os critérios propostos por Lessa et al. (2019). Para a medição da segregação, empregou-se o Índice Global (IGM) e Local (ILM) de Moran (Anselin, 1995).
O primeiro corresponde ao IA, desenvolvido e aplicado para análise do caso do município de Belo Horizonte/MG, a partir de dados extraídos da pesquisa OD 2012 (Minas Gerais, 2012). Seu cálculo baseia-se na média aritmética de três dimensões: Indicador Razão de Densidade de Ponto (IRD), representado pela relação entre o número de pontos de ônibus e a densidade demográfica da unidade de análise (campo, indicado na Figura 1); Indicador Razão de Linhas (IRL), calculado a partir do número de linhas de ônibus por ponto de embarque e desembarque (PED) em cada da unidade de análise; e Indicador Razão de Frequência (IRF), representado pela relação entre número total de viagens de ônibus por PED em cada unidade de análise (Lessa et al., 2019).
O segundo índice refere-se aos Índices Local e Global de Moran, que medem a correlação espacial, sendo aplicados em pesquisas para mensurar a segregação através da formação de agrupamentos em distintos contextos (Haddad, 2020). Yao et al. (2018), em sua revisão metodológica, classificam os Índices de Moran como índices de agrupamento espacial. Para tanto, recorreu-se à base de dados do Censo Demográfico de 2010 (IBGE, 2010). As variáveis do Censo foram a renda média domiciliar (RMD) em 2010 e a população residente em 2010. A RMD foi empregada como uma proxy para estimar a segregação urbana de forma unidimensional, tendo em vista que a literatura indica maior segregação econômica do que racial (Sabatini, 2006). A população, em proporção à área, foi utilizada no cálculo da densidade demográfica local, variável que compõe o IA.
A unidade espacial de análise empregada é denominada Campos (Figura 1), compreendendo o segundo nível de agregação da pesquisa OD. A capital mineira possui um total de 120 Campos (Figura 1). Como as informações do Censo Demográfico estão disponíveis em setores censitários, foi necessária sua compatibilização com os Campos da OD, por meio da análise dos centroides dos setores, associando cada um ao Campo em cuja área estivesse localizado. Essa abordagem é adequada, pois os Campos correspondem à agregação de áreas homogêneas, geralmente compatíveis com os limites dos setores censitários. Para mensurar a segregação, considerando os clusters espaciais – distintos por diferentes níveis de dependência espacial –, empregou-se um indicador de agrupamentos locais. Assim, quanto mais semelhante for a distribuição da população, dada a matriz de vizinhança considerada, mais estará aglomerada e, portanto, maior será a segregação ali presente (Massey & Denton, 1988). Sua manifestação, dada pela associação espacial, é identificada pelo ILM, que, combinado aos parâmetros do IGM, possibilita identificar agrupamentos espaciais. O ILM testa a autocorrelação local e detecta objetos espaciais com influência no IGM (Anselin, 1995), enquanto o IGM indica o nível de interdependência espacial entre todos os polígonos.
Para avaliar a relação entre os índices de segregação e a acessibilidade por ônibus, considerados em sua dimensão local (não global), foi utilizado o modelo de regressão espacial local denominado GWR (Geographically Weighted Regression). Essa técnica auxilia na identificação das variações geográficas nas relações entre variáveis, oferecendo uma visão detalhada da distribuição espacial das variáveis. Ao contrário dos modelos globais que assumem relações uniformes em todo o espaço, a GWR permite que essas relações tenham variações locais, ajustando-se às especificidades de cada área estudada. Nesse sentido, sua análise é realizada por meio do coeficiente de determinação ajustado (R²) para avaliar o ajuste do modelo, dos coeficientes locais para entender a relação espacial, dos resíduos para identificar áreas de baixo desempenho do modelo e dos erros padrão dos coeficientes para avaliar a confiabilidade das estimativas locais. Como será discutido na próxima seção, essa abordagem permite evidenciar variações locais importantes, identificando áreas onde a relação entre segregação e acessibilidade é mais intensa ou, ao contrário, praticamente inexistente.
No presente estudo, não se recorreu à regressão logística, pois os resíduos apresentam correlação espacial de 0,63. Considerou-se como variável dependente o IA e, como variável independente, a presença ou não de segregação, incluída neste estudo como uma variável binária, cujo valor 1 indica a existência dessa característica, enquanto o valor zero denota a inexistência. Ou seja, quando o IGM indica que o campo está contido em algum agrupamento (alto-alto e alto-baixo ou baixo-baixo e baixo-alto) demonstrando que há presença de segregação, o valor corresponde a 1; do contrário, atribui-se valor 0. O método utilizado para definir a largura de banda ou vizinhos foi o AIC (Akaike Information Criterion).
Além dos índices de regressão local, estimados para cada campo, foi analisada a distribuição espacial dos resíduos padronizados, que representam o grau de ajustamento/explicação ao modelo local. Para classificação foi selecionado o método denominado Natural Breaks (Jenks), que busca encontrar os intervalos de classes de forma a minimizar a variância interna, identificando as maiores diferenças entre os limites de cada intervalo.
Resultados e Discussão
A análise da distribuição espacial da RMD (Figura 2a) em Belo Horizonte indica que as maiores médias estão concentradas nas regionais Centro-Sul e Pampulha, enquanto as porções mais ao sul (Barreiro) e ao norte (Venda Nova e Norte) do município apresentam predominância de Campos com menor renda domiciliar. Os resultados do Índice Global de Moran (IGM), que avalia a dependência espacial dos rendimentos, indicam valor de 0,552, o que revela dependência espacial positiva e confirma a existência de agrupamentos em Belo Horizonte, além de sugerir particularidades nos arranjos espaciais locais.
A partir do Índice de Moran (Figura 2b), foram delimitados quatro clusters que evidenciam padrões de segregação na dimensão de agrupamento de Belo Horizonte. O primeiro, destacado em vermelho, localiza-se na regional Centro-Sul e reúne Campos com alta RMD e vizinhos que apresentam o mesmo padrão, sendo por isso denominado agrupamento Centro-Sul. Essa área é tradicionalmente associada a elevados níveis de renda e ampla oferta de serviços, equipamentos e infraestrutura, o que contribui para a manutenção desse perfil socioeconômico. Nesse agrupamento, dois Campos destoam do padrão predominante – a Favela Santa Lúcia e o Aglomerado da Serra –, pois apresentam baixa RMD, mas estão cercados por áreas de alta RMD. A inclusão desses dois casos é relevante, pois evidenciam contrastes socioespaciais expressivos, bem como a coexistência de realidades distintas em áreas muito próximas.
Os demais clusters, representados em azul, concentram-se nas regiões periféricas e reúnem Campos com baixa RMD e vizinhos em condições semelhantes, configurando áreas homogêneas de menor renda. No município, três agrupamentos apresentam esse perfil: Venda Nova, Norte/Nordeste e Barreiro. Esses territórios, localizados nos extremos norte e sul da capital, refletem processos históricos de urbanização periférica e mantêm menor acesso a oportunidades urbanas e serviços, o que reforça padrões de desigualdade socioespacial já consolidados.
Essa configuração espacial do município, que reflete o padrão da segregação urbana, pode ser explicada, em boa medida, pela acentuada centralidade exercida pela regional Centro-Sul, resultante da concentração de oportunidades (i.e., serviços, comércio, empregos, equipamentos culturais, escolas). Tal centralidade está associada à formação histórica do município, cuja região central foi planejada (Arrais, 2010), bem como à atuação de políticas que, ao longo do tempo, reforçam padrões de desigualdade socioespaciais. Nesse contexto, o acesso ao transporte coletivo pode ser considerado um dos bens de consumo coletivo com forte impacto na segregação por ampliar as oportunidades e favorecer a mobilidade social.
No que tange à acessibilidade da população, os resultados indicam que as áreas com maiores Índices de Acessibilidade (IA) são atendidas por importantes infraestruturas voltadas ao transporte por ônibus, seja por uma estação de integração BHBus ou por algum corredor viário com grande densidade de PEDs de passageiros, como nos Campos Carlos Prates, Pampulha, Vilarinho e Barreiro de Baixo. Em sentido oposto, as porções mais extremas a leste, oeste, nordeste e noroeste do município apresentam maiores dificuldades de acesso por ônibus, apesar de serem áreas com elevada dependência desse modo de transporte.
Para além da descrição de cada indicador, a análise comparativa exploratória evidencia que os clusters com menor renda domiciliar também registram níveis reduzidos de acessibilidade ao sistema de transporte por ônibus. A sobreposição cartográfica desses dois indicadores (Figura 3) revela correspondências significativas. Os Campos Santo Agostinho, Barro Preto, Centro e São Lucas, situados na regional Centro-Sul, combinam alta RMD com vizinhanças de características semelhantes e elevado IA potencial. Em contraposição, os Campos segregados localizados nas porções mais extremas da capital apresentam baixa RMD, acompanhada de baixo IA, tanto para si quanto para seus vizinhos. Entre eles destacam-se Letícia (agrupamento Venda Nova), Isidoro (agrupamento Norte/Nordeste) e Sul do Barreiro (agrupamento Barreiro). Ressalta-se que, nos locais com clusters de baixa RMD, não há ocorrência de Campos com alto IA, o que reforça a interseção entre desigualdades de renda e de acesso ao sistema de transporte.
Os resultados sintetizados na Figura 4, que ilustra o comportamento das variáveis IRD, IRL, IRF e IA, indicam que: no agrupamento Venda Nova, as variáveis se mantêm próximas a zero, com desvios negativos para IRD, IRL e IA; no Norte/Nordeste, as médias também se aproximam de zero, com desvios negativos em todas as variáveis; no Centro-Sul, as médias são positivas para todas as variáveis, revelando um padrão distinto em relação aos demais agrupamentos; e no Barreiro, as médias são negativas, embora com magnitudes menores do que as observadas nos demais clusters de baixa renda. Observa-se, ainda, que a amplitude dos intervalos interquartis varia entre os agrupamentos, evidenciando diferentes graus de desigualdade interna. Os agrupamentos Centro-Sul e Barreiro apresentam intervalos interquartis mais amplos, sugerindo maior variabilidade nas variáveis.
Essas evidências também confirmam as melhores condições de atendimento do sistema de transporte coletivo por ônibus na região central de Belo Horizonte, onde se encontra parte da população de maior RMD. Tal cenário pode ser atribuído à forte centralização ainda presente na estrutura espacial da capital mineira, conforme já indicado por Lessa et al. (2019). Ademais, a configuração viária radiocêntrica contribui para os altos valores dos indicadores que compõem o IA no agrupamento Centro-Sul. Cabe, entretanto, refletir sobre a mobilidade efetiva, expressa pela demanda do sistema, considerando o perfil dos residentes desses agrupamentos.
Como já destacado por Lessa et al. (2019), a discrepância entre demanda e atendimento da rede de transporte por ônibus se acentua nos agrupamentos onde reside a maior parte da população de menor renda. Nesses locais, a demanda é elevada, pois grande parte dos deslocamentos depende exclusivamente do sistema público/coletivo, em função dos custos associados ao uso do automóvel particular. No caso de Belo Horizonte, o índice de acessibilidade calculado neste estudo refere-se à acessibilidade potencial, pois considera apenas a disponibilidade de infraestrutura. Assim, embora áreas de menor renda tendam a depender mais do transporte coletivo, isso não significa que a demanda efetiva seja sempre elevada. A análise de Lessa et al. (2019) demonstra justamente a diferença entre a acessibilidade potencial, medida pela oferta de infraestrutura, e a mobilidade efetiva, refletida na demanda real observada.
Em contrapartida, o nível de atendimento do sistema nessas áreas é baixo. Novamente, observa-se que os agrupamentos localizados nas extremidades do território municipal concentram as duas dimensões de segregação – a concentração espacial e o agrupamento, conforme mensurado pelo Índice Local de Moran –, configurando regiões que demandam maiores investimentos para ampliar o acesso ao sistema de transporte coletivo.
Conforme apresentado no Quadro 1, os Campos do agrupamento Centro-Sul apresentam valores elevados para os indicadores que compõem o IA, em comparação não apenas aos Campos inseridos na mesma regional, mas também ao conjunto do município – com exceção do indicador IRF, para o qual somente o Campo Santo Agostinho registrou valor alto. De forma oposta, os Campos dos agrupamentos Venda Nova, Norte/Nordeste e Barreiro apresentam valores baixos para esses indicadores tanto no contexto das respectivas regionais quanto em relação a Belo Horizonte como um todo. Apenas em duas unidades foram identificados altos valores para o indicador IRF – Isidoro e Sul do Barreiro.
Cada agrupamento apresenta características distintas em relação aos componentes do IA, o que se reflete na variabilidade observada entre eles. O agrupamento Centro-Sul, por exemplo, registra os valores mais elevados do IA, evidenciando um alto desempenho no atendimento do sistema de transporte por ônibus. Nesse caso, a maior disponibilidade de pontos de embarque e desembarque (IRD) e o maior número de linhas de ônibus (IRL) são os fatores que mais contribuem para o bom desempenho do indicador.
Por outro lado, os agrupamentos Venda Nova, Norte/Nordeste e Barreiro apresentam valores mais baixos, indicando desempenho relativamente inferior em termos de acessibilidade ao sistema. Nessas áreas, o componente que mais influencia o IA é a frequência das linhas nos pontos (IRF), mas há carência significativa na distribuição de opções de pontos de embarque e desembarque (IRD) e número de linhas (IRL) que atendem os respectivos Campos (Quadro 1).
Os resultados gerais do GWR indicam um R² de 51%, sugerindo que a segregação socioeconômica explica apenas parcialmente a variação na acessibilidade ao transporte público em Belo Horizonte (Figura 5a). O R² ajustado de 36% reforça que, ao se considerar o número de variáveis preditoras, permanece uma parcela considerável de variação no IA não explicada exclusivamente pela segregação. Esses valores de R², embora não sejam considerados elevados, evidenciam a complexidade das relações espaciais envolvidas. A acessibilidade ao transporte público não depende apenas de segregação socioeconômica; fatores como densidade urbana, distribuição de empregos, infraestrutura disponível e uso de diferentes modos de transporte também exercem influência.
O valor do Akaike Information Criterion (AIC) de 194,55 sugere um ajuste razoável do modelo, mas aponta margem para refinamento. Isso reforça a importância de analisar com maior atenção a distribuição espacial dos resíduos padronizados, a fim de identificar padrões não captados pelas variáveis incluídas no modelo.
O R², que representa a decomposição do valor global, não indica alto poder de predição da segregação espacial com base nos valores de IA, o que reforça que a disponibilidade de serviços de transporte por ônibus não é, isoladamente, um fator determinante para a segregação espacial da população de Belo Horizonte. Ainda assim, é possível identificar particularidades da distribuição espacial, uma vez que, em geral, os índices não ultrapassam 0,242. Além da acessibilidade, medida pela oferta de transporte por ônibus, outras variáveis sociais também podem influenciar no nível de segregação, como a configuração do espaço urbano, a complexidade das atividades econômicas e o acesso aos outros modos de transporte.
A heterogeneidade espacial revelada por esta análise é um aspecto relevante: as relações entre acessibilidade e segregação variam significativamente entre diferentes áreas da cidade, como evidencia o GWR. Isso significa que o impacto da segregação sobre a acessibilidade ao transporte público não é uniforme – em algumas regiões, ele é mais acentuado, enquanto em outras, fatores locais podem atenuar ou potencializar esse efeito. Tal heterogeneidade ajuda a explicar os baixos valores de R² encontrados, indicando que outros fatores não contemplados no modelo influenciam fortemente o IA em certas regiões.
Nesse contexto, a análise dos resíduos padronizados é fundamental (Figura 5b), pois revela discrepâncias entre os valores previstos e os observados, identificando áreas onde o comportamento espacial diverge do esperado. Duas situações se destacam: i) altos resíduos positivos (em vermelho), que indicam locais com acessibilidade observada maior do que a prevista, como Isidoro, Letícia e Sul do Barreiro, onde, apesar da alta segregação, a infraestrutura de transporte é mais eficiente do que o modelo estimou, e áreas da Centro-Sul como Santo Agostinho, Centro e São Lucas, onde a densidade de serviços e a qualidade da infraestrutura parecem compensar desigualdades econômicas; e ii) altos resíduos negativos (em azul escuro), que apontam locais com acessibilidade observada inferior à prevista, mesmo em contextos de baixa segregação, como Gutierrez-Grajau, Lourdes e Cidade Jardim. Nesses casos, embora a combinação de baixa segregação e localização privilegiada indicasse maior facilidade de acesso ao sistema de transporte coletivo, os valores observados sugerem o contrário. Isso pode estar associado à predominância do uso de automóveis particulares, que reduz a demanda e, consequentemente, a frequência e a diversidade de linhas de ônibus, além de desencorajar investimentos consistentes na rede local.
Também é possível que, nessas áreas, o desenho viário, a localização de pontos de embarque e desembarque e a oferta de conexões inter-regionais não favoreçam o transporte coletivo, resultando em tempos de deslocamento pouco competitivos em relação ao transporte individual. Ressalta-se, porém, que no referido agrupamento e em seu entorno imediato encontram-se Campos que abrangem aglomerados como a Favela Santa Lúcia e a Favela da Serra, que concentram grande parte da população de menor renda e cuja dependência do transporte coletivo por ônibus é elevada. Paradoxalmente, como evidenciado na Figura 3, justamente nesses locais os níveis de acessibilidade são menores, configurando uma sobreposição espacial de vulnerabilidades – baixa renda e baixa acessibilidade –, reforçando a desigualdade territorial no acesso ao transporte.
A inclusão desses casos na análise permite evidenciar heterogeneidades internas aos agrupamentos, evitando interpretações homogêneas de territórios complexos e ressaltando a coexistência de realidades socioeconômicas contrastantes. Essa constatação evidencia a necessidade de políticas mais direcionadas para qualificar o serviço nas áreas onde a demanda social é mais premente, incorporando parâmetros que considerem não apenas indicadores médios de desempenho, mas também as condições específicas das populações que mais dependem do sistema.
Considerações Finais
A comparação dos indicadores de acessibilidade, organizada conforme as categorias de agrupamentos espaciais, aponta uma relação inversa entre renda e acesso ao sistema de transporte por ônibus no município de Belo Horizonte. Em áreas com baixa RMD, por exemplo, não foi observado nenhum campo com alto IA, o que reforça a necessidade de investimentos para aprimorar o acesso ao sistema de ônibus nessas localidades. As diferenças entre os agrupamentos são evidentes: o agrupamento Centro-Sul registrou os valores mais elevados para todos os indicadores do IA, enquanto Venda Nova, Norte/Nordeste e Barreiro apresentaram um desempenho relativamente inferior.
Entre os fatores que influenciam esse desempenho, destacam-se a distribuição dos pontos de embarque e desembarque e o número de linhas de ônibus disponíveis. Embora os resultados do modelo GWR não confirmem a segregação como fator direto da acessibilidade ao transporte por ônibus, os resíduos padronizados do modelo sugerem a prevalência de acessibilidade subestimada em diversos Campos do município. Esse padrão confirma a concentração e a desigualdade no acesso ao sistema de transporte coletivo, conforme também observado por Haddad (2020) ao indicar que a centralização de empregos no Centro-Sul leva a população de menor renda, residente em áreas menos servida de transporte público, a realizar deslocamentos mais longos e sujeitos a congestionamentos diariamente.
A análise dos resíduos padronizados não apenas identifica as áreas onde o modelo GWR não captura adequadamente as dinâmicas locais, mas também revela a heterogeneidade espacial nas relações entre segregação e acessibilidade. Essa variação reforça que a acessibilidade ao transporte coletivo é influenciada por fatores diversos, como os padrões locais de deslocamento e a infraestrutura disponível. Nesse sentido, o estudo dos resíduos padronizados oferece insumos valiosos para políticas públicas mais direcionadas: em áreas com resíduos negativos, há demanda por ampliação da oferta ou integração mais eficaz de diferentes modos; já em áreas com resíduos positivos, as boas práticas de infraestrutura poderiam ser replicadas em outras partes da cidade.
A baixa acessibilidade para os grupos mais vulneráveis tem contribuído para o aumento da frota de automóveis e motocicletas, com impactos diretos no congestionamento, na sinistralidade e na segregação espacial. Essas disparidades reforçam a necessidade de políticas públicas mais efetivas para reduzir as desigualdades urbanas e garantir acesso equitativo às oportunidades e ao uso do espaço urbano (Hernandez, 2018). A distribuição equitativa dos bens e serviços urbanos não pode se limitar à reorganização do uso do solo ou ao ajuste de tarifas; é fundamental avançar para uma perspectiva espacial do acesso ao transporte, reconhecendo seu papel na efetivação do direito à cidade.
Por fim, a metodologia empregada para relacionar segregação e padrão de acessibilidade mostra-se aplicável à análise das dinâmicas socioespaciais de outros municípios e capitais brasileiras, a partir de uma perspectiva comparativa. Além disso, este estudo contribui para a compreensão da segregação tanto como fenômeno residencial quanto como experiência vivida no cotidiano de deslocamentos, especialmente diante das necessidades de mobilidade no espaço urbano (Liao et al., 2025).
Referências 
ANSELIN, L. (1995). Local Indicators of Spatial Association-LISA. Geographical Analysis, 27(2), 93-115. https://doi.org/10.1111/j.1538-4632.1995.tb00338.x
ARRAIS, C. A. (2010). A construção de Belo Horizonte e o projeto de memória de Aarão Reis. Diálogos, 14(3), 579–603. https://repositorio.bc.ufg.br/items/ae96d3b8-8eb8-4ad2-a501-660a305ca738
BEN-AKIVA, M., & LERMAN, S. R. (2018). Discrete choice analysis: Theory and application to travel demand. The MIT Press.
BOCAREJO, J. P. S., & OVIEDO, D. R. H. (2012) Transport accessibility and social inequities: a tool for identification of mobility needs and evaluation of transport investments. Journal of Transport Geography, 24, 142–154. https://doi.org/10.1016/j.jtrangeo.2011.12.004
CARDOSO, A., & PRÉTECEILLE, E. (2023). As classes médias e as transformações socioespaciais das metrópoles do Rio de Janeiro e São Paulo: 2000–2010. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, 25(1). https://doi.org/10.22296/2317-1529.rbeur.202311pt
CERQUEIRA, E. V., & DINIZ, A. M. A. (2023). As desigualdades de acessibilidade às oportunidades cotidianas na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Confins, 58. https://doi.org/10.4000/confins.50719
CHEN, W., GAO, Q., & XIONG, H.-G. (2017). Uncovering urban mobility patterns and impact of spatial distribution of places on movements. International Journal of Modern Physics C, 28(1), 1750004. https://doi.org/10.1142/S0129183117500048
GEURS, K., & VAN ECK, R. (2001). Accessibility measures: Review and applications. Evaluation of accessibility impacts of land-use transportation scenarios, and related social and economic impact (RIVM Report 265). National Institute for Public Health and the Environment.
GUZMAN, L., OVIEDO HERNÁNDEZ, D., & ARDILA, A. (2019). La política de transporte urbano como herramienta para disminuir desigualdades sociales y mejorar la calidad de vida urbana en Latinoamérica (Vol. 2). Centro de los Objetivos de Desarrollo Sostenible para América Latina y el Caribe (CODS). https://discovery.ucl.ac.uk/id/eprint/10138413/
HADDAD, M. A. (2020). Residential income segregation and commuting in a Latin American city. Applied Geography, 117, 102186. https://doi.org/10.1016/j.apgeog.2020.102186
HANSEN, W. G. (1959). Accessibility and residential growth [Master’s thesis, Massachusetts Institute of Technology]. MIT Libraries. http://hdl.handle.net/1721.1/74869
HERNANDEZ, D. (2018). Uneven mobilities, uneven opportunities: Social distribution of public transport, accessibility to jobs and education in Montevideo. Journal of Transport Geography, 67, 119–125. https://doi.org/10.1016/j.jtrangeo.2017.08.017
IBGE. (2022). Censo demográfico 2022. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. https://censo2022.ibge.gov.br
IBGE. (2010). Censo demográfico 2010: Características urbanísticas do entorno dos domicílios. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. https://ww2.ibge.gov.br
KOENIG, J. G. (1980). Indicators of urban accessibility: Theory and application. Transportation, 9(2), 145–172. https://doi.org/10.1007/BF00167128
LE ROUX, G., VALLÉE, J., & COMMENGES, H. (2017). Social segregation around the clock in the Paris region (France). Journal of Transport Geography, 59, 134–145. https://doi.org/10.1016/j.jtrangeo.2017.02.003
LESSA, D. A., LOBO, C., & CARDOSO, L. (2019). Accessibility and urban mobility by bus in Belo Horizonte/Minas Gerais – Brazil. Journal of Transport Geography, 77, 1–10. https://doi.org/10.1016/j.jtrangeo.2019.04.004
LIAO, Y., GIL, J., YEH, S., PEREIRA, R. H. M., & ALESSANDRETTI, L. (2025). Socio-spatial segregation and human mobility: A review of empirical evidence. Computers, Environment and Urban Systems, 117, 102250. https://doi.org/10.1016/j.compenvurbsys.2025.102250
MARQUES, E. (2012). Social networks, segregation and poverty in São Paulo. International Journal of Urban and Regional Research, 36(5), 958–979. https://doi.org/10.1111/j.1468-2427.2012.01143.x
MASSEY, D. S., & DENTON, N. A. (1988). The dimensions of residential segregation. Social Forces, 67(2), 281–315. https://doi.org/10.2307/2579183
MINAS GERAIS. (2012). Pesquisa origem e destino 2011–2012. Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
MUSTERD, S., & OSTENDORF, W. J. M. (EDS.). (1998). Urban segregation and the welfare state: Inequality and exclusion in Western cities. Routledge.
PARK, S., OSHAN, T. M., EL ALI, A., & FINAMORE, A. (2021). Are we breaking bubbles as we move? Using a large sample to explore the relationship between urban mobility and segregation. Computers, Environment and Urban Systems, 86, 101585. https://doi.org/10.1016/j.compenvurbsys.2020.101585
SABATINI, F. (2006). La segregación social del espacio en las ciudades de América Latina. Banco Interamericano de Desarrollo. https://doi.org/10.18235/0009848
SHELLER, M., & URRY, J. (2006). The new mobilities paradigm. Environment and Planning A, 38(2), 207–226. https://doi.org/10.1068/a37268
SMETS, P., & SALMAN, T. (2016). The multi-layered-ness of urban segregation: On the simultaneous inclusion and exclusion in Latin American cities. Habitat International, 54, 80–87. https://doi.org/10.1016/j.habitatint.2015.08.013
YAO, J., WONG, D. W. S., BAILEY, N., & MINTON, J. (2018). Spatial segregation measures: A methodological review. Tijdschrift voor Economische en Sociale Geografie, 110(3), 235–250. https://doi.org/10.1111/tesg.12305
ABREVIATURAS, ACRÓNIMOS, SIGLAS
AIC - Akaike Information Criterion
GWR - Geographically Weighted Regression
IA - Índice de Acessibilidade
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IGM - Índice Global de Moran
ILM - Índice Local de Moran
IRF - Indicador Razão de Frequência
IRD - Indicador Razão de Densidade
IRL - Indicador Razão de Linhas
MG - Minas Gerais
OD - Origem e Destino
PED - Ponto de Embarque e Desembarque
R² - Coeficiente de Determinação Quadrado
RMD - Renda Média Domiciliar
Daniela Antunes Lessa
Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora adjunta da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), atua na área de Engenharia de Transportes. Credenciada nos Programas de Pós-Graduação em Geotecnia e Transportes (Geotrans) da UFMG e de Engenharia Ambiental (Proamb) da Ufop. Possui graduação em Engenharia Civil pela UFMG e pela École Nationale des Ponts et Chaussées (ENPC/França) e mestrado em Geotecnia e Transportes (UFMG). Atua nas linhas de pesquisa Mobilidade/Acessibilidade, Organização do Espaço e Geografia dos Transportes, incluindo a utilização de métodos quantitativos aplicados à análise espacial.
Ana Paula Vasconcelos Gonçalves
Professora adjunta do Departamento de Sociologia e docente permanente no Programa de Pós-Graduação em sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É doutora em Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp/Uerj), mestre em Pesquisas Sociais e Estudos Populacionais pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE), bacharel e licenciada em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Integrante do Programa Intensivo de Metodologia (MQ/UFMG). Tem experiência nas áreas de metodologia de pesquisa, métodos quantitativos, sociologia urbana, desigualdades, estratificação, trabalho e violência.
Ana Marcela Ardila Pinto
Professora de Sociologia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Graduada e mestre em Sociologia pela Universidad Nacional de Colombia e douta em Geografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Sociologia, atuando principalmente nos seguintes temas: sociologia urbana, espaço público, Bogotá, Rio de Janeiro, política urbana, representação e ordem urbana.
Carlos Fernando Ferreira Lobo
Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pós-doutor em Demografia pelo Núcleo de Estudos de População Elza Berquó, Universidade Estadual de Campinas (Nepo/Unicamp). Diretor do Instituto de Geociências da UFMG (2022-2026) e professor associado do Departamento de Geografia da UFMG. Credenciado nos Programas de Pós-Graduação em Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais (UFMG), além do PPG em Geografia da Universidade Federal de São João de-Rei (UFSJ). Líder do grupo de pesquisa Acessibilidade e Mobilidade Urbana (CNPq). Atua em Geografia da População e dos Transportes, com foco em migrações, mobilidade espacial e métodos quantitativos aplicados à análise espacial.
Autores
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Segregação e acessibilidade ao
transporte público por ônibus.
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Este artigo tem como objetivo identificar os diferentes agrupamentos espaciais relacionados aos padrões de segregação e associá-los à acessibilidade por ônibus da população do município. Tais agrupamentos serão analisados com base em indicadores de segregação por renda construídos a partir do Índice de Moran Local e no Índice de Acessibilidade (IA) ao sistema de transporte coletivo por ônibus
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Figura 1. Campos, regionais administrativas e área central do município de Belo Horizonte.
Fonte: Elaboração própria.
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Figura 2. Distribuição da renda média domiciliar – RMD (a) e Índice Local de Moran –ILM (b) no município de Belo Horizonte.
Fonte: Elaboração própria.
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Figura 3. Índices de Moran e de Acessibilidade para o município de Belo Horizonte.
Fonte: Elaboração própria a partir de Lessa et al. (2019).
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
Figura 4.Bloxplot – IRD, IRL, IRF e IA, segundo os agrupamentos Venda Nova, Norte/Nordeste, Centro-Sul e Barreiro do município de Belo Horizonte.
Fonte: Elaboração própria.
|
Agrupamentos |
Campos atípico |
IRD |
IRL |
IRF |
|
Centro-Sul |
Sto. Agostinho |
Muito baixo |
Muito baixo |
Muito baixo |
|
Barro Preto |
Muito alto |
Muito alto |
Muito alto |
|
|
Centro |
Alto |
Alto |
Alto |
|
|
São Lucas |
Alto |
Alto |
Alto |
|
|
Venda Nova |
Letícia |
Muito alto |
Muito alto |
Muito alto |
|
Norte/Nordeste |
Isidoro |
Muito baixo |
Muito baixo |
Muito alto |
|
Barreiro |
Muito Baixo |
Muito baixo |
Muito baixo |
Muito baixo |
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil
O caso de Belo Horizonte/MG – Brasil