Recibido: 17 de enero de 2022; Aceptado: 12 de abril de 2023; Revision Received: 22 de mayo de 2023
Palacete Neomanuelino da Foz do Douro (Porto, Portugal): um testemunho de revivalismo "nacional"? (séculos XIX-XX)*
Neomanuelino Palace of Foz do Douro (Porto, Portugal): A Testimonial of "National" Revivalism? (19th-20th Centuries)
Palacete neomanuelino en Foz do Douro (Porto, Portugal): ¿un testimonio de revivalismo "nacional"? (siglos XIX-XX)
Resumen
Ubicado en la Avenida do Brasil, en Foz do Douro (Oporto, Portugal), el Palacio Neomanuelino fue construido entre 1910 y 1911 por la familia Jorge Guimarães, con autoría atribuida a José Teixeira Lopes. El edificio es uno de los pocos ejemplos de arquitectura de pueblo de finales del siglo XIX y principios del XX que persistió en los cambios urbanísticos de la segunda mitad del siglo. Con el objetivo de estudiar este ejemplo de arquitectura revi-valista portuguesa, el artículo analiza una serie de planos y permisos de trabajo, cartografía, registros fotográficos y diversas Fontes bibliográficas referentes al propietario, al arquitecto y a la obra arquitectónica, teniendo como punto de partida la indagación en la elección de la ubicación y el lenguaje arquitectónico utilizado, así como la relación del edificio con el estilo nacional y la casa portuguesa. Estos últimos temas ocuparon el panorama intelectual portugués en las décadas posteriores a la construcción del palacio, lo cual generó la discusión sobre la existencia del estilo neomanuelino o si es fruto de un eclecticismo. También se debe señalar que el palacio tiene elementos que forman parte de un razonamiento sobre la arquitectura de la vivienda portuguesa y la existencia de un estilo nacional, con una fuerte identidad, premisas que serán la base de la teorización de la casa portuguesa.
Palavras clave:
Palacete neomanuelino, arquitectura, arquitectura de veraneo, historia de la arquitectura, revivalismo, José Teixeira Lopes, Foz do Douro, Porto, historia de Portugal, siglo XX, identidad nacional, nacionalismo cultural.Resumo
Situado na Avenida do Brasil, na Foz do Douro (Porto, Portugal), o Palacete Neomanuelino é construído entre 1910 e 1911 pela família Jorge Guimarães, com autoria atribuída a José Teixeira Lopes. É um dos poucos exemplares da arquitetura de vilegiatura do final do século XIX e início do XX que persistiu às alterações urbanísticas da segunda metade do século. Com o objetivo de estudar este exemplar de arquitetura revivalista portuguesa, o presente artigo analisa uma série de plantas e licenças de obras, cartografias, registos fotográficos e várias fontes bibliográficas referentes ao proprietário, ao arquiteto e à obra arquitetónica, tendo como ponto de partida a indagação da escolha do local e da linguagem arquitetónica utilizada, bem como a relação do edifício com o estilo nacional e a casa portuguesa. Estas últimas temáticas ocuparam o panorama intelectual português nas décadas posteriores à construção do palacete, destacando-se a discussão acerca da existência do neomanuelino ou se este é resultante de um ecletismo. Note-se ainda que o palacete possui elementos integrantes de um raciocínio sobre a arquitetura habitacional portuguesa e a existência de um estilo nacional, de forte pendor identitário, premissas que estarão na base da teorização da casa portuguesa.
Palavras-chave:
palacete neomanuelino, arquitetura, arquitetura de vilegiatura, história da arquitetura, revivalismo, José Teixeira Lopes, Foz do Douro, Porto, história de Portugal, século XX, identidade nacional, nacionalismo cultural.Abstract
Located on Avenida do Brasil, in Foz do Douro (Porto, Portugal), the Neomanuelino Palace was built between 1910 and 1911 by the Jorge Guimarães family, with authorship attributed to José Teixeira Lopes. It is one of the few examples of village architecture from the end of the 19th and beginning of the 20th centuries that persisted in the urban changes of the second half of the century. With the aim of studying this example of Portuguese revivalist architecture, this article analyzes a series of plans and work permits, cartography, photographic records and various bibliographic sources referring to the owner, the architect and the architectural work, having as a starting point the inquiry into the choice of location and the architectural language used, as well as the relationship of the building with the national style and the casa portuguesa. These last themes occupied the Portuguese intellectual panorama in the decades after the construction of the palace, highlighting the discussion about the existence of the neo-Manueline style or whether it is the result of an eclecticism. It should also be noted that the palace has elements that are part of a reasoning about Portuguese housing architecture and the existence of a national style, with a strong identity, premises that will be the basis of the theorization of the casa portuguesa (Portuguese house).
Keywords:
Palacete neomanuelino, architecture, summerhouses, history of architecture, revivalism, José Teixeira Lopes, Foz do Douro, Porto, history of Portugal, 20th century, national identity, cultural nationalism.Nota prévia
Localizado entre a Avenida do Brasil, no. 777, e a Rua de Gondarém, no. 729, na Foz do Douro, o Palacete Neomanuelino possui diversos nomes pelo qual é conhecido, dos quais se destacam Casa do Sapateiro da Foz e Casa do Relógio do Sol, nomenclaturas associadas à história do edifício ou a elementos característicos do mesmo. Este edifício carece de investigação científica, simplesmente abordado num artigo de Maria Filomena de Carvalho, mas pouco aprofundado, e referido como um exemplar relevante da arquitetura de vilegiatura no âmbito da Dissertação de Mestrado em História da Arte, apresentada pela mesma autora à Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 1997, bem como é tratado em alguns artigos de caráter lúdico da revista Viva!, contudo sem um caráter científico necessário ao seu estudo. É ainda apresentada uma breve análise sobre o mesmo no sítio Monumentos, do SIPA. Perante esta bibliografia, deparamo-nos com a necessidade de um estudo atualizado e aprofundado do palacete, de modo a poder catalisar conhecimentos associados ao mesmo e que se encontram em risco de se perderem devido ao avançado estado de má conservação do edifício e à total descaracterização da zona envolvente. A falta de estudos sobre este poderá prender-se na priorização de outros edifícios revivalistas e ecléticos, nomeadamente o Palácio da Pena e o Palácio do Buçaco, ambos em Sintra. O facto de não possuir uma autoria definida, mas sim uma atribuição a José Teixeira Lopes, leva a que aquando do estudo deste arquiteto, se referenciem outras obras, como a Casa-Museu Teixeira Lopes ou a Casa da Quinta da Bela-Vista (atual Instituto Moderno do Porto).
Ao longo desta investigação tentar-se-á compreender o motivo pela escolha deste local, pela família Jorge Guimarães, para a construção da sua casa de veraneio, assim como a escolha desta linguagem arquitetónica e os materiais e técnicas empregues. De igual modo procurar-se-á entender o que é o estilo nacional e de que maneira está relacionado com a palacete, bem como o que é a casa portuguesa, cujas premissas poderão encontrar-se parcialmente neste edifício e que nas décadas sucessivas à sua construção desenvolver-se-ão. É ainda necessário indagar acerca da atribuição da autoria a José Teixeira Lopes, investigando para tal a sua linguagem artística, formação, obras e possíveis influências. Apenas compreendendo estas questões e tendo em consideração o período histórico, político e sociocultural, é que que se poderá traçar uma conclusão sobre o palacete em estudo. Deste modo, o estudo desta arquitetura permitirá desenvolver diversas temáticas associadas, nomeadamente o genius loci da zona em que se insere, a problemática sobre o estilo nacional e a casa portuguesa, e a arquitetura de vilegiatura.
A recolha de dados será constituída quer por fontes primárias quer por fontes secundárias, visando uma maior validação científica. As fontes primárias consistem em plantas e licenças de obras referentes ao edifício em análise, cartografias do local em que se insere e registos fotográficos de diversos períodos e em diferentes estados de conservação. Por sua vez, as fontes secundárias são compostas por monografias, artigos científicos e dissertações que abordem as problemáticas acima elencadas, mas também por artigos jornalísticos que permitam obter um maior número de informações referentes aos proprietários e à história do edifício. Um conjunto constituído por uma cronologia, uma árvore genealógica e tabelas de comparação documental, contribuirão de igual modo para o desenvolvimento da investigação.
A metodologia utilizada terá por base a divisão da investigação em três áreas: proprietário, arquiteto e obra arquitetónica. A cada área aplicar-se-á o mesmo processo de investigação: primeiramente levantar-se-ão questões específicas a respeito do campo em análise, posteriormente far-se-á o levantamento bibliográfico para averiguação dos factos e procura de respostas. Com base nas informações obtidas analisar-se-ão e sintetizar-se-ão os diferentes dados para que se possa explanar e organizar as diferentes questões articulando-as entre as diferentes áreas, para que se elabore uma conclusão do estudo efetuado, podendo-se posteriormente apresentar o resultado.
Introdução
Na segunda metade do século XIX, a frente marítima da Foz do Douro depara-se com uma alteração do seu modus vivendi, começando a receber a comunidade inglesa e algumas famílias da burguesia portuense que aqui pretendiam refugiar-se no período estival, por ser um local mais fresco e afastado do caos citadino, introduzindo a moda de "ir a banhos"1, com um gradual aumento durante a segunda metade do século, à semelhança do que ocorria na Vila de Cascais e na Granja. A prática da vilegiatura, que remonta ao final do século XVIII, e com particular incidência num grupo de elite francesa no início do século seguinte, apenas se desenvolverá a partir de 1840 em toda a Europa. Esta praxis consistia na deslocação de um individuo e da sua família ou amigos próximos, geralmente no início de agosto, para uma região afastada da cidade, escolhendo-se preferencialmente o campo, onde passariam aí uma temporada, até ao final de outubro ou início de novembro, podendo desta forma aproveitar igualmente do período de caça2.
É neste contexto que, a 1 de abril de 1907, Beatriz Fernandes Jorge Guimarães e o capitão Artur Jorge Guimarães adquirem um terreno na Avenida de Carreiros a Joaquim Soares Pereira Neves e esposa3, para a construção de uma casa de habitação4, com projeto atribuído ao arquiteto José Teixeira Lopes5, e António Gonçalves de Cardoso como mestre de obras, sendo aprovado a 20 de novembro do mesmo ano6, vindo a ser construída em 1910, e concluída a 5 de dezembro de 19117, convertendo-se na casa de veraneio da família. Artur Jorge Guimarães, capitão de artilharia, é um republicano portuense de renome, tendo inclusive publicado Os deveres do Cidadão, em 1912, oferecido pela Câmara Municipal do Porto de forma gratuita no âmbito da comemoração do 2.° aniversário da proclamação da República. Exercerá a 22 de abril de 1915 o cargo de vice-presidente da nova Comissão administrativa da Câmara do Porto, e presidirá a mesma comissão instalada após a revolução de 5 de dezembro de 19178 e nomeada por alvará do Governo Civil a 16 de janeiro de 19189. Após o falecimento do capitão, a viúva deixa de viver permanentemente no Porto, vindo a casa a ser herdada posteriormente pela filha Maria Beatriz Jorge Guimarães de Cantos10. Em 1974, no rescaldo da Revolução de 25 de abril, período que viria a ser conhecido como PREC11, o palacete é ocupado ilegalmente por um sapateiro até cerca de 199712, o que levará a que o palacete seja igualmente conhecido como casa do sapateiro da Foz.
Figura 1: Palacete Neomanuelino, Foz do Douro (Porto)
Foz: zona de vilegiatura
Desde o início do século XIX que assistimos a um desenvolvimento desta área urbana, procurando-se igualmente aproximar a Foz ao burgo do Porto. Em 1833 existiam já dois caminhos entre os dois núcleos13. Ao longo de todo o século XIX, esta área urbana recebe particular atenção. Em 1838 inicia-se o paredão do molhe de Carreiros, sendo este retomado em 1869 e construído o segundo tramo entre 1881 e 1885. Em 1864, dá-se a abertura da Estrada de Carreiros, entre a Foz e Matosinhos que possibilitará a construção de casas apalaçadas da aristocracia e alta burguesia, numa ânsia de afirmação social. Em 1865, termina-se a estrada ribeirinha entre a Foz (Velha) e o Porto, permitindo que circulasse um maior número de carruagens em menor tempo e com uma maior comodidade, visto na década de 1840 demorar-se entre seis e oito horas, com o Carroção14. A abertura da linha do Americano15, em 1871, entre o Porto e a Foz Nova, mas apenas inaugurada a 9 de março de 1872, dá resposta à elevada afluência a esta área urbana em expansão em cerca de vinte e cinco minutos16:
[...] seguiram-se os char-à-bancs; e [...] o movimento aumentou extraordinariamente e a vida nesta praia entrou na sua fase moderna. Como eram insuficientes as casas da antiga povoação, circunscrita nos pequenos bairros do Monte, da Praia e da Cantareira, as novas edificações começaram a estender-se por Carreiros, aonde se abriu a formosa estrada de Leça, batida pelo oceano, varrida pela brisa marítima, impregnada das penetrantes exalações salgadas. Alguns dos novos prédios construídos neste sítio [...] seguiram os modelos das construções francesas do mesmo género e oferecem o elegante aspeto modesto e confortável, tão raro nas casas portuguesas.17
Figura 2: Foz do douro: Hilda e Hugo Paz dos Reis na beira da praia
É ainda de relevar a expansão da Avenida da Boavista, aberta em 1794, e estendida ao longo de todo o século XIX, até à sua conclusão na Praça Gonçalves Zarco18, que permite igualmente uma melhor articulação entre o burgo portuense e esta área costeira, assim como a inauguração da linha da Companhia Carris de Ferro do Porto, a 27 de junho de 1878, onde se introduz os veículos de tração a vapor19. Na década de 80 do séc. XIX dá-se a mudança total do paradigma da Foz, deixando de ser o principal porto comercial da cidade do Porto, em detrimento da construção do porto de Leixões, entre 1884-189520, passando a ser um local de excelência para veraneio das classes mais altas, o que levará a uma série de campanhas de melhoramento desta zona urbana, como a construção do Passeio Alegre, entre 1879 e 189221, e o melhoramento da Avenida de Carreiros, em 1888, conferindo o ambiente cosmopolita de boulevard, que se coaduna com o espírito romântico da época que se pretende para a Foz. Note-se que a prática da construção deste tipo de passeios à beira-mar encontra paralelos no the Steine de Brigthon e na Promenade des Anglais de Nice22, populares núcleos de vilegiatura, aproximando a Foz do Douro da realidade internacional.
Paulatinamente, a Foz do Douro dará lugar a um dos bairros mais luxuosos da cidade do Porto, frequentado pelas classes mais elevadas que aqui passam a residir, em detrimento da comunidade piscatória, agora confinada na zona da cantareira (Foz Velha). Será a nova Avenida de Carreiros, planeada e urbanizada, que ditará o desenvolvimento da Foz Nova, com espaços de promenade e construções de maiores dimensões dispostas regularmente, contrariando a hipertrofia característica da Foz Velha, no seguimento das diversas campanhas camarárias de alinhamento e construção de arruamentos na zona da Foz desde 183823. Aqui erguem-se diversas habitações de vilegiatura com diferentes referenciais ao nível do projeto, sendo uns pautados pelo exotismo e características estrangeiras importadas, como os chalets, outros de matriz beauxartiana, por influência da cultura francesa, sendo Paris um centro irradiante de cultura, por excelência; mas também habitações marcadamente historicistas, onde se aplicam revivalismo24. No final do século XIX continuar-se-á o desenvolvimento desta zona, com a eletrificação da iluminação pública e com a substituição dos transportes a vapor pelos elétricos, em 1895, assim como a extensão do sistema de esgotos à Foz e Carreiros, em 1909, no seguimento do Plano de saneamento da cidade25.
Figura 3: Planta da zona do Molhe, Foz do Douro (1887-1892)
Manuelino: problemática acerca do revivalismo nacional
Não obstante as diversas nomenclaturas atribuídas, o palacete é maioritariamente conhecido como Palacete Neomanuelino, devido à aplicação de diversos elementos neomanuelinos no programa plástico, nomeadamente vãos mainelados e arcos polilobados com motivos de cordames e da heráldica dita manuelina. Na segunda metade do século XIX e nas primeiras décadas do século XX há um debate intenso sobre qual o estilo nacional português, no seguimento do desenvolvimento de ideias nacionalistas em toda a Europa, que levam as diversas nações a procurar valores nacionais que os distingam, imbuídos de um forte patriotismo. De igual forma, contribui para a criação de um historicismo romântico e de uma particular ideia do passado, na qual está presente o pittoresco26.
Em Portugal, os intelectuais e connoisseurs dividem-se entre o gótico e o manuelino, aludindo aos grandes monumentos nacionais, que vêm a ganhar maior destaque e uma atenção redobrada após o estudo dos mesmos por estrangeiros, como é o caso do Conde Raczynski27, bem como por uma crescente visita por parte das elites europeias que no início do século XIX escolhem Portugal como parte integrante do itinerário do seu Grand tour, devido à sensibilidade romântica da época28. Ignácio de Vilhena Barbosa considera que o gótico, com o Mosteiro de Santa Maria da Vitória29 como principal exemplar, chegou a Portugal por influência estrangeira, nomeadamente de Inglaterra, através das relações diplomáticas entre os dois reinos30, não sendo um estilo nacional, mas um estilo que entra em decadência através do acrescento de elementos ornamentais "distribuídos com menos bom gosto" e combinação de estilos, sendo assim um estilo de transição, a que se dá o nome de manuelino ou "gothico florido" 31:
O estilo architectonico, com a sua formosa ornamentação, que produziu o monumento da Batalha, veiu-nos do estrangeiro. Se o acceitámos em toda a sua pureza e perfeição, foi porque se amoldava exactamente ao estado de desenvolvimento moral da nação.32
Por outro lado, determinados intelectuais aceitam o manuelino como estilo, como Almeida Garrett e Varnhagen, que o consideram um estilo original nacional, enquanto Alexandre Herculano e o conde Raczynski, por outro lado, consideram-no um estilo de compromisso nacional e por isso patriótico33. Varnhagen34 alude ao estilo manuelino como uma cultura artística única de Portugal, tendo como principais características o predomínio do arco de volta perfeita e de sarapanel (arco abatido), bem como a tolerância aos restantes arcos, profusão de motivos ornamentais como medalhões, arabescos e divisas35; nichos e baldaquinos rendados nos corpos verticais; intercalação de diferentes capiteis e ausência de simetria36.
Almeida Garrett é igualmente um dos difusores do termo manuelino aplicado a uma cultura artística nacional, nomeadamente no artigo "Claustro de Belém", do Jornal das Bellas-Artes, n°6, em que subdivide a arte portuguesa em cinco épocas, sendo a terceira a época do manuelino, o qual considera ser "propriamente portuguez", resultante de uma combinação de diferentes culturas artísticas mas que têm como base e como fim um espírito nacionalista, com o Mosteiro de Belém como principal difusor desta prática arquitetónica37. Já Joaquim de Vasconcelos38 refuta a existência de um estilo nacionalista, afirmando que as conclusões a que chegaram Varnhagen e Almeida Garret foram fruto de um frágil estudo e da falta de recursos comparativos com outros exemplares europeus. Acusa ainda Varnhagen de ser vago e pouco preciso na identificação do dito estilo manuelino, nomeadamente quando este afirma que é caracterizado por uma "tolerância a todas as mais voltas", o que só negaria qualquer estilo. Conclui que o termo manuelino deverá apenas ser empregue às arquiteturas do reinado de D. Manuel I, e que o designado estilo manuelino não apresenta qualquer originalidade ou sistema arquitetónico que permita identificar os edifícios manuelino, visto não existir rigor no planeamento ou definição objetiva da funcionalidade dos elementos arquitetónicos, bem como não existe uma aceção ornamental seguida, aplicando-se motivos vegetalistas, figurativos e nacionais sem qualquer sequência lógica ou hierarquização, sendo assim mas uma cultura artística que acolhe e aplica várias influências artísticas europeias39, desde o gótico inglês ao classicismo renascentista italiano e ao exotismo moçárabe do sul da Península Ibérica, ao gosto do executante ou do encomendador. Denota ainda que as arquiteturas deste período tinham um longo período de execução, pelo que seria natural a absorção de diferentes linguagens artísticas40. Este debate é igualmente alimentado pelo levantamento de diversas vozes, das quais se destaca Alexandre Herculano, contra a venda de monumentos nacionais em hasta pública41, sendo os mesmos muitas vezes destruídos para a construção de praças ou de novos edifícios, prática que se alastra até ao início do século XX, escrevendo-se diversos artigos em defesa da preservação patrimonial:
Esta [época] começou há poucos anos; mas nesses poucos anos já dera maior número de páginas malditas à história da arte, do que lhe deu século e meio. O picão e o camartelo só há bem pouco tempo que podem dizer: triunfámos! [...] agora derrubam torres e coruchéus, partem colunas, abatem muros, quebram lousas de sepulcros, e apagam todas as provas da história.42
Perante esta conjuntura, é de indagar a escolha do manuelino como estilo do novo palacete construído pelo capitão Artur Jorge Guimarães. Esta escolha poderá prender-se, segundo Maria Filomena Carvalho, no gosto e poder económico do comitente, utilizando uma linguagem de estilo nacional empregue frequentemente no ideal republicano, num período em que se assinalava os 500 anos da partida de Vasco da Gama para Índia43. Por outro lado, o revivalismo medieval vinha a ser fomentado pela própria burguesia abastada portuguesa desde o início do XIX, comitente de palácios, equipamentos de lazer e edifícios empresariais44, abandonando a anterior tendência classicista, pelo que a profusão desta estética poderá ter igualmente influenciado o gosto do comitente e a vontade em aplicá-lo num novo programa:
O estylo manuelino, que floresceu no nosso paiz durante o brilhante periodo dos descobrimentos, reflecte os sonhos dourados, as ridentes esperanças, os desejos anhelante dos ínclitos portuguezes d'aquelle tempo, cuja imaginação era illuminada pelos esplendores procedentes dos encantados paizes da aurora prenhes de maravilhas.45
É de notar que o republicanismo vinha a crescer desde o final da década de 1870, apelando a um regime político nacional, de forte cunho patriota, em detrimento do socialismo, que em Portugal figura sob o realismo artístico-literário46, sob fortes influências de Proudhon47. Como forma de cultuar os elementos identitários de Portugal, a primeira República recorrerá à etnografia, nomeadamente às teses de Joaquim de Vasconcelos que serão recuperadas por Teófilo Braga48. A opção por este estilo pode igualmente ser parte da linguagem utilizada pelo arquiteto José Teixeira Lopes que "projeta segundo a sua maneira de ver, de forma a produzir a casa moderna, mas imprimindo-lhe um cunho português, pelo que é louvável"49. No início do século XX, Portugal vive um período de grande necessidade de exaltação nacional, após o Ultimato Inglês de 1890 e a ditadura de João Franco, em 1907, estando-se nas vésperas do Regicídio50, pelo que a aplicação de elementos de caráter nacionalista assume um papel patriótico.
José Teixeira Lopes
José Teixeira Lopes (1872 - 1919), arquiteto portuense, pertence a uma família de artistas, sendo filho do escultor e ceramista José Joaquim Teixeira Lopes e da sua esposa Raquel Pereira Meireles, e irmão do escultor António Teixeira Lopes51, assim como é sobrinho do colecionador Marciano d'Azuaga52. Frequentou a Escola Portuense de Belas-Artes do Porto, tendo ingressado em 1885 e terminado o 5.° ano de Arquitetura e o 5.° ano de Desenho Histórico em 1891-189253. Entre 1892 e 1897 vive em Paris, para onde viaja para aperfeiçoamento, prática recorrente à época, onde se prepara inclusive para o concurso de "Beaux-Arts" na oficina de Blondel. Em Paris tem contacto com o seu irmão e com o arquiteto Adães Bermudes, que viria a ser conhecido pelas suas obras ecléticas e revivalistas, sendo igualmente formado pela Academia Portuense de Belas-Artes54. José Teixeira Lopes e Adães Bermudes manterão sempre relações pessoais e profissionais no Porto.
Em 1897 retorna a Portugal, sendo um dos fundadores da Sociedade Portuense de Belas-Artes, em 1898, juntamente com vários artistas portuenses, que tem como objetivo a criação de exposições e conferências artísticas para desenvolver a cultura artística portuense55. No Porto desempenha diversas funções, tendo sido secretário da 1.a Comissão de Estética da Câmara Municipal do Porto, em 1913, cuja presidência era exercida por Marques da Silva (na altura Diretor da Escola de Belas Arte do Porto), bem como Presidente do Conselho Diretor da delegação do Norte da Associação dos Arquitetos Portugueses56 em julho de 1912, cargo homónimo ocupado em Lisboa por Adães Bermudes57.
Meu caro Bermudes,
Muitas felicitações para a tua ideia.
Conta com a minha adhesão.
Abraços do António.
Teu...58
Teixeira Lopes participa no VI Congresso Internacional de Arquitetos, em 1904, em Madrid, juntamente com diversos arquitetos, dos quais se destacam Ventura Terra, Adães Bermudes, Raul Lino e João Lino de Carvalho59. Neste congresso um dos temas abordados foi a preservação e restauro de monumentos arquitetónicos, bem como a influência de métodos modernos de construção nas formas artísticas60. Em julho de 1906 integra no VII Congresso Internacional de Arquitetos, em Londres, onde participam igualmente Ventura Terra, Lino de Carvalho e J. Alexandre Soares, sendo que em março de 1907 a Assembleia Geral da Sociedade dos Arquitetos Portugueses elege sócios correspondentes estrangeiros, nomeadamente os ingleses W. John Locke, John Belcher e J. Nixon Horsfield, bem como os austríacos Hans Peschl e Otto Wagner61, tendo estes sido membros de comissões da referida conferência62.
Neste congresso debate-se a propriedade artística das obras e dos desenhos de arquitetura; as construções em cimento armado e aço, entre outros. Durante o congresso tiveram a oportunidade de visitar diversos edifícios, nomeadamente o Palácio de Buckingham, Abadia de Westminster, Catedral de Westminster, Catedral de S. Paulo, Igreja de S. Bartolomeu o Grande, Institute of Chartered Accountants, Palácio de Kensington, Torre de Londres, Tower Bridge, Victoria and Albert Museum Royal College of Science, Hospital, Greenwich Hospital, Casas do Parlamento, assim como as Universidades de Oxford e Cambridge, o Castelo de Windsor, Hampton Court Palace, Hatfield House, Bridge Water House, entre outras63. Estes congressos permitem o contacto com arquiteturas e arquitetos de diferentes nacionalidades, debatendo em conjunto problemáticas arquitetónicas, novos materiais construtivos e engenharias, bem como o estatuto do arquiteto.
Palacete da família Jorge Guimarães
O palacete não se apresenta como uma casa típica do Porto, estreita e alta, mas antes como uma casa grande, característica das elites portuenses, que passam a habitar a zona alta da cidade e os novos eixos urbanísticos, e que possuem um traço único, integrando diferentes linguagens estéticas e arquitetónicas64, particularidades que serão igualmente utilizadas nas novas casas de vilegiatura da linha costeira da foz do Douro, nas quais se insere o palacete em estudo. O gosto pela linguagem beauxartiana é justificado pela permanência dos artistas em Paris, como complemento dos seus estudos, o qual Teixeira Lopes não é exceção, adaptando-a posteriormente à realidade portuguesa. Há assim um corte com o neopalladianismo vigente até então no Porto, por influência inglesa65.
Contudo, o Palacete da família Jorge Guimarães é pautado por um revivalismo nacionalista que contraria as tendências cosmopolitas e burguesas dos edifícios beauxartianos que então irradiavam pelas principais cidades do reino. Esta oposição às influências estrangeiras e a valorização das arquiteturas nacionais, com características pitorescas, estarão na origem da casa portuguesa, a qual é considerada como primeiro exemplar portuense a Casa Ricardo Severo, construída em 190466. Neste âmbito, Raúl Lino dá um grande contributo, refletindo sobre a casa portuguesa. Ao contrário de diversos historiadores e arquitetos, considera que "não se distingue por qualquer disposição geral de planta"67 das habitações estrangeiras, bem como não existiria um só tipo de casa portuguesa68, devido à variedade etnográfica existente no país, com elementos que divergem de região para região69. Aponta o alpendre como elemento mais transversal da arquitetura portuguesa, aplicado em diversas regiões e a habitações de diferentes classes, devido a uma importância dada pelos portugueses à entrada da residência70. O azulejo, por sua vez, recebe um grande destaque em Portugal, contrariamente às outras nações, acentuando o caráter decorativo de que as habitações portuguesas careciam, à semelhança dos vãos, "guarnecidos de cantaria"71, sendo assim valorizados em detrimento de outros elementos da venustas.
Raúl Lino considera que a arquitetura do reinado de D. Manuel I, com "a marca inconfundível do estilo manuelino", enriquece a arquitetura através dos elementos plásticos em que são empregues diferentes culturas artísticas, como o gótico, o naturalismo, o renascimento e a arte mudéjar72. Por outro lado, destaca-se o forte cunho cenográfico impresso pela linguagem neomanuelina, influência de cenógrafos italianos a trabalhar em Portugal, como Giuseppe Cinatti, responsáveis pela criação de cenários no teatro lírico e pela projeção de edifícios vários, os quais influenciam o gosto estético da alta sociedade e agem como modelos a novas construções73.
Figura 4: Alçado da fachada principal (1907)
Desta forma, o palacete apresenta-se como uma habitação unifamiliar, no seguimento da prática da habitação da burguesia portuense, que no período pós-almadino perpetua a vontade de habitar em edifícios unifamiliares com acessos independentes74, à qual o arquiteto dá uma roupagem revivalista, introduzindo elementos neomanuelinos. É nesta medida uma arquitetura pastiche. Possui um logradouro, novidade introduzida nas habitações portuenses a partir do final do século XVIII, quando se passa a incluir terrenos junto da habitação para a criação destes75.
A aplicação de novos elementos e de novas soluções estão associadas às casas unifami-liares, predominantemente das classes mais elevadas, devido às possibilidades económicas e interesses específicos que divergem da maioria populacional, tendo como principal preocupação o conforto e a adaptabilidade a um novo estilo de vida, servindo ao mesmo tempo como campos de ensaio para a aplicação posterior em edifícios públicos de maior escala76.
Possui uma leitura clara entre o exterior e o interior, nomeadamente na organização dos espaços77, sendo deste modo herdeira da arquitetura francesa, possivelmente fruto do percurso do arquiteto. Contudo, é na fachada, à semelhança da casa portuguesa78, onde predominam elementos que melhor transmitem o caráter nacional e que nos transportam para um imaginário revivalista. Apesar da fachada granítica ser associada às arquiteturas ecléticas do início do século XX, o palacete é rebocado e caiado, com alguns pormenores decorativos feitos em alvenaria79.
Figura 5: Plantas dos diferentes níveis (1907)
Organiza-se em diversos níveis. O primeiro nível possui um caráter funcional, aqui encontram-se a garagem, com o acesso feito através de um vão de arco apontado, e a cozinha, com um elevador para as refeições, bem como os aposentos da criadagem, ligado com os restantes pisos através de uma escada de serviço. A garagem é um elemento que permite distinguir este edifício das demais casas de morada da Foz, demonstrando o poder económico do proprietário. O segundo nível, o piano nobile, é destinado às divisões sociais, possuindo assim uma sequência de salas, como a 'sala de família' e a 'sala de jantar', bem como uma biblioteca. Ao salão é dada uma grande importância por parte da burguesia, no século XIX, por aí poderem realizar saraus literários, concertos e pequenos bailes, contribuindo para a sua afirmação na sociedade. Já o terceiro é reservado para o fórum privado, com os quartos e uma sala de estar. Os diferentes níveis possuem quartos de banho, ao estilo das water-closets que então começavam a ser frequentes nas casas das elites, onde as "retretes terão bacias com syphão e a autoclysmo para descarga da agua"80. Um quarto nível é dado através do mirante, com uma pequena sala. É ainda apresentado um quarto nível, no corpo central, que se sobreleva em relação aos restantes corpos, destinado ao mirante. À semelhança das casas nobres e dos solares, o acesso ao andar nobre é feito através de uma escadaria lançada que conduz à entrada, com um arco canopial, protegida por um alpendre, ou loggia, rasgado por vãos geminados81, embora não possuam mainel, e suportado por uma arcaria de arcos apontados. Possui ainda uma guarda, que recorda as gelosias, de influência moçárabe, mas que Raúl Lino considera características dos edifícios históricos do Minho (particularmente em Guimarães e Braga), onde figuram elementos da regalia manuelina, nomeadamente as esferas armilares, a cruz da Ordem de Cristo e os cordames, utilizados igualmente no beiral do alpendre.
O palacete possui diversos elementos estéticos que serão considerados como fazendo parte da casa portuguesa, nomeadamente os elementos salientes. As torres82 são exemplo disto, possuindo particular expressão nas habitações nortenhas, sendo aqui recordada através do mirante. Assim como as chaminés ressaltadas, tradicionalmente utilizadas nas regiões do Alentejo e Algarve, também aqui recebem um tratamento plástico cuidado, ou os botaréus que, à semelhança do Convento de Cristo em Tomar83, enquadram dois dos vãos voltados para o pátio central. Apesar de não apresentarem uma função tectónica, animam a fachada e os vãos, perlongando-os, fazendo com que vazem o próprio beiral. O piano nobile possui um vão de sacada abalaustrada, voltado para o pátio central, com dois vãos mistilíneos84 enquadrados por arcos de volta perfeita, e suportado por mísulas e por uma coluna, disposta no ângulo central.
Os restantes vãos voltados quer para o pátio central quer para a via pública são geminados, com um colunelo trabalhado como mainel, com exceção dos vãos de sacada, rasgados como vãos mistilíneos. O vão do terceiro nível possuía uma guarda em ferro (entretanto retirada), enquanto a do último nível é em alvenaria. Esta conceção é uma alteração ao projeto inicial, onde os dois vãos que se abrem sob a via pública seriam mistilíneos e ambas as guardas seriam em alvenaria. A restante planimetria segue-se bastante fiel ao projeto inicial. A fachada norte recebe um tratamento plástico bastante mais simples, concentrado na moldura dos vãos, com vãos de verga reta com friso nos dois primeiros níveis, e vãos geminados no terceiro nível. Apenas o vão voltado para a via pública recebe um tratamento plástico semelhante aos vãos voltados para o pátio central. Nesta fachada encontravam-se as entradas de acesso ao nível inferior, utilizadas pela criadagem, assim como a entrada lateral da garagem.
A fachada posterior, de caráter mais intimista, voltada para o logradouro, é marcada por um grande vão de arco apontado, rasgado transversalmente aos primeiro e segundo pisos, contrariamente ao projeto original, sendo que interiormente assumia-se como um arco trilobado. Possuía um vitral, inundando o vão de escada com uma luz mística, à semelhança das catedrais e igrejas góticas. Aqui situa-se uma segunda escadaria exterior, que permite o acesso quer ao rés-do-chão quer ao primeiro nível. É ainda de notar a alteração da extensão do segundo nível, face ao projeto inicial, conferindo assim uma fachada com um aspeto unitário e robusto.
O palacete possui um relógio de sol, na aresta do mirante voltada para o pátio central, que recorda uma pedra de armas de um solar ou casa nobre, onde figura um mascarão ao centro. Detém ainda um nicho85, para a colocação de imaginária, que remete para as habitações populares portuguesas. A cobertura, em águas múltiplas, possui um beiral à portuguesa, remetendo novamente para as habitações populares. Contrariamente ao projeto original, possui uma água furtada de reduzida dimensão no corpo lateral norte, podendo tratar-se de uma alteração feita em 1924, aquando das obras de reparação do telhado e das fachadas (rebocadas e caiadas)86. Recebe igualmente azulejos, aplicados no alpendre e na moldura de uns dos vãos voltados para o pátio central, com um programa que alude aos descobrimentos, nomeadamente a partida das naus em Belém.
Conclusões
O Palacete Neomanuelino é um dos exemplares da arquitetura de vilegiatura da Foz do Douro, no Porto, sendo utilizado como casa de veraneio da família Jorge Guimarães, até à sua ocupação ilegal por um sapateiro. É de relevar as constantes designações do palacete, que atestam a singularidade deste na Foz. A utilização do neomanuelino como linguagem plástica prende-se com o comitente, o capitão Artur Jorge Guimarães, republicano portuense, que poderá ter escolhido esta linguagem como apanágio do seu patriotismo, sendo que o palacete é edificado numa época de necessidade de exaltação nacional, nas vésperas da Implantação da República, sendo precisamente utilizado o manuelino na imaginária do ideal republicano, hipótese esta defendida por Filomena de Carvalho. Contudo, é de notar a escolha do manuelino no edifício, mesmo que concentrado na venustas, numa época em que se coloca em questão a validade desta cultura artística como estilo nacional, optan-do-se antes por uma nova linguagem de influência beauxartiana, com particular desenvolvimento nos novos edifícios portuenses, impulsionado por Marques da Silva.
Assim, a opção de um revivalismo nacionalista poderá recair numa oposição às tendências cosmopolitas e burguesas de influência francesa que então começavam a imperar. A sua autoria, embora não possa ser confirmada, visto o projeto não estar assinado, é atribuída ao arquiteto José Teixeira Lopes, caracterizado pela aplicação de elementos revivalistas e pittorescos nos seus edifícios, sendo que estes se enquadram, em planta e alçado, nas práticas arquitetónicas da época em que se inserem, nomeadamente a utilização de perpianho, argamassa hidráulica e areia nas paredes, sendo toda a ornamentação exterior feita em cimento. Relativamente à problemática da casa portuguesa, o Palacete enquadra-se em diversos aspetos, nomeadamente na valorização dos vãos, plasticamente mais ricos, e na existência de uma escadaria exterior que conduz ao piano nobile, sendo esta entrada protegida por um alpendre. Contudo, a presença destes elementos justifica-se pela linguagem arquitetónica associada a esta tipologia de habitação de veraneio, pertencente a uma família de classe elevada, pelo que os elementos anteriormente elencados possuem um caráter funcional e nobilitador.
Sendo assim, o Palacete Neomanuelino apresenta diversas características nacionais, contudo não deverá ser utilizado como um exemplo prático da arquitetura portuguesa, por esta problemática vir a ser desenvolvida posteriormente e aplicada num contexto diverso do Palacete Neomanuelino. A metodologia aplicada permite uma maior validação científica, permitindo a refutação de informações erróneas e a corroboração de determinadas hipóteses. Apesar da impossibilidade de consultar determinada bibliografia, constrangimento associado à situação pandémica vigente à data de investigação, existe um acervo considerável de artigos científicos, dissertações, registos fotográficos e cartografias, entre outras fontes, disponíveis em-linha, pelo que esta contrariedade é facilmente ultrapassada desde que se aceda a fontes de entidades cientificamente validadas. O presente estudo possibilitará igualmente a prospeção de futuras investigações relacionadas com o revivalismo e com a arquitetura de vilegiatura, bem como sobre o desenvolvimento urbanístico da Foz do Douro.
Referências
Fontes primárias
Arquivos
- [1] Arquivo Histórico Municipal do Porto (AHMP), Porto-Portugal. Série: Plantas de casas, Licenças de Obras. 🠔
- [2] Centro Português de Fotografia (CPF), Porto-Portugal. Fondo: Aurélio da Paz dos Reis 1870/1949, Serie: Fotografías, Subserie: Fotografias em vidro e película. 🠔
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Publicações periódicas
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- [6] Ribeiro, José-Diogo. "Archeologia christã". Boletim de Architectura e de Archeologia, Tomo 5.C1, 2.a série (1876): 173-174. 🠔
Documentos impressos e manuscritos
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Fontes secundárias
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