Publicado

2017-01-01

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? The return of the Diroá: an Ontological Turn?

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = A volta dos Diroá: uma virada ontológica?

DOI:

https://doi.org/10.15446/ma.v8n1.66882

Palabras clave:

vida, Diroá, hijos de madre, protección, ʉtãpinopona, tuyuka (es)
life, Diroá, mother’s children, protection, Ʉtãpinopona, Tuyuka (en)
vida, Diroá, filhos de mãe, proteção, Ʉtãpinopona, Tuyuka (pt)

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Autores/as

  • Pedro Sarmento Lemos Sábio do povo Tuyuka (Ʉhtãpirõporã)
  • Justino Sarmento Rezende Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS)
Este texto bilingüe (tuyuka/tukano-portugués) presenta la intervención de los Diroá en defensa de sus “hijos de madre” (hijos de hermanas de madre, es decir, pueblos con los que no se puede contraer matrimonio) después del ataque de los payés. El texto es una forma de protección del ser humano contra los ataques de las fuerzas destructivas de los enemigos humanos. El sabio Pedro, del pueblo tuyuka, lo narró en 2015. Justino Sarmiento, doctorando (del pueblo tuyuka) en antropología social del programa de postgrado en antropología social de la Universidade Federal do Amazonas, hizo la traducción y el análisis antropológico del texto.

This bilingual (Tukuya/Tukano-Portuguese) article presents the intervention of the Diroá in defense of their “mother’s children” (mother’s sisters’ children, that is, non-marriageable peoples) after the attack of the pajés. The text is a form of protection of the human being against the destructive forces of human enemies. The elder Pedro, of the Tuyuka people, narrated it in 2015. Justino Sarmiento, doctoral candidate (of the Tuyuka people) in social anthropology at the Graduate Program in Social Anthropology of the Universidade Federal do Amazonas (Manaus, Brazil), conducted the translation and anthropological analysis of the text.

Este texto bilíngue (Tuyuka/Tukano-Português) apresenta a intervenção dos Diroá em defesa aos seus primos irmãos (“filhos de mãe”) após o ataque dos “Pajés”. O texto é uma versão de proteção do ser humano contra as forças destrutivas dos inimigos humanos. Foi narrada pelo sábio Pedro do povo Tuyuka no ano de 2015. A tradução do texto e a análise antropológica são de Justino Sarmento, doutorando (do povo Tuyuka) em Antropologia Social no PPGAS-UFAM.

Texto indígena

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? A volta dos Diroá: uma virada ontológica?

Narrador: Pedro Sarmento Lemos.

Recopilação, tradução e análise: Justino Sarmento Rezende.

Línguas: Tuyuka (ISO 693-3 tue), Tukano (ISO 693-3 tuo).

Recolhido em Manaus, no dia 15 de agosto de 2015.

Como citar este artigo: Sarmento-Lemos, P. & Sarmento-Rezende, J. (2017). Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari?/A volta dos Diroá: uma virada ontológica?. Mundo Amazónico, 8(1). e66882.https://doi.org/10.15446/ma.v8n1.66882

Editor: Juan A. Echeverri

Fecha de envío: 2017-08-07 Fecha de aceptación: 2017-08-07

Pedro Sarmento-Lemos1

Justino Sarmento-Rezende2


1Sábio do povo Tuyuka (Ʉhtãpirõporã).

2Dʉpô (bahseke wame ‘nome de benzimento’); doutorando em Antropologia Social do PPGAS/UFAM e membro do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena – NEAI/UFAM. justinosdb@yahoo.com.br


Were neorõ: Ati puripʉre ohanowʉ Diroá na “Pahko-Porãre” maĩ yaiware wehẽ amerã ehakarore. Toho nika, mahsarẽ wetiro darerã a’tiro ni bahsesama ni ohanowʉ (tukano). Atie ano hoa turige diarige wanoarã kʉa kʉore niro tia. Tiere wedewi, yʉ pako-makʉ Pedro Sarmento Lemos, 2015 kʉma niri. Tieri tʉoñe, hoa tu, siro tieri biro niro tiku maripʉreha hĩrigʉ niki Justino Sarmento, Ʉtãpinopona parami, ati kʉma, pekasã kʉã doutorado Antropologia kʉa hĩrere buegʉ niki. Atiere hoanowʉ Ʉtãpinopona kʉa wedesere mena, Yepâ-bahsoka (Daseá) wedesere mena, tie bire pekasã kʉa wederese mena hoanowʉ (Tuyuka).

Ato ukusehe:kahtiro; Diroá; pahko-porãre; wetirodarero; Ʉhtãpirõporã; Ʉtãpinopona.

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? / A volta dos Diroá: uma virada ontológica?

Resumo:Este texto bilíngue (Tuyuka/Tukano-Português) apresenta a intervenção dos Diroá em defesa aos seus primos irmãos (“filhos de mãe”) após o ataque dos pajés. O texto é uma versão de proteção do ser humano contra as forças destrutivas dos inimigos humanos. Foi narrada pelo sábio Pedro Sarmento Lemos do povo Tuyuka no ano de 2015. A tradução do texto e a análise antropológica são de Justino Sarmento, doutorando (do povo Tuyuka) em Antropologia Social no PPGAS-UFAM.

Palavras-chave: vida; Diroá; filhos de mãe; proteção; Ʉtãpinopona; Tuyuka.

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? / The return of the Diroá: An ontological turn?

Abstract This bilingual (Tukuya/Tukano-Portuguese) article presents the intervention of the Diroá in defense of their “mother’s children” (mother’s sisters’ children, that is, non-marriageable peoples) after the attack of the pajés. The text is a form of protection of the human being against the destructive forces of human enemies. The elder Pedro Sarmento Lemos, of the Tuyuka people, narrated it in 2015. Justino Sarmiento, doctoral candidate (of the Tuyuka people) in social anthropology at the Graduate Program in Social Anthropology of the Universidade Federal do Amazonas (Manaus, Brazil), conducted the translation and anthropological analysis of the text.

Keywords: life; Diroá; mother’s children; protection; Ʉtãpinopona; Tuyuka.

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? / El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?

Resumen: Este texto bilingüe (tuyuka/tukano-portugués) presenta la intervención de los Diroá en defensa de sus “hijos de madre” (hijos de hermanas de madre, es decir, pueblos con los que no se puede contraer matrimonio) después del ataque de los payés. El texto es una forma de protección del ser humano contra los ataques de las fuerzas destructivas de los enemigos humanos. El sabio Pedro, del pueblo tuyuka, lo narró en 2015. Justino Sarmiento, doctorando (del pueblo tuyuka) en antropología social del Programa de Postgrado en Antropología Social de la Universidade Federal do Amazonas, hizo la traducción y el análisis antropológico del texto.

Palabras claves:vida; Diroá; hijos de madre; protección; ʉtãpinopona; tuyuka.


Uku nʉkãro/Introdução

Ʉhtãpirõpora na iña weresehe/Olhares e explicações dos Tuyuka

Diroá, Handeyʉ “Pahko-Por㔠níparã/Diroá são “filhos de mãe” do Handeyʉ

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari?/A Volta dos Diroá: uma virada ontológica?

Uku yahpa darero/Considerações finais

Notas sobre a grafia e pronúncia das palavras em Tukano oriental

Referências

Uku nʉkãro

Introdução

Ati purirẽ iñara tʉoñerasama, wiopehsaro merã, Yepa-mahasãyere, ãnusere bohkarãti nirã na añuro uku ehõpeosere: Diroá na kihtire, toho nikã mahsarẽ wetirodarerã na bahseherã bohkarãsama.

Apresento ao leitor um texto que trata de um tema muito significativo para os povos indígenas pertencentes à família linguística Tukano oriental no manejo de suas experiências de vida: a presença do Diroá e a fórmula de proteção da vida humana diante das forças inimigas.

Ʉhtãpirõpora na iña weresehe

Olhares e explicações dos Tuyuka 1

Marĩ mahsãkapʉta bahserã (bahsegʉ, kumu) marĩ eheripõrarẽ bahsetohama ni werewã yʉ ñehkʉsʉmʉã. Kumû eheriporã bahsesami wimagʉrẽ, wimagorẽ, kʉ ati ʉmʉkho kahãse nisere mahsĩ, marĩ pamʉmʉhãtike kihtire mahsigʉ te merã narẽ bahsesami. Na mahsã na bahsenokarã nirã ati ʉmʉkohopʉre añuro tʉoña, añurõ niseti, keoro nirã nisama ati ʉmʉkohopʉre. Toho nikã ati ʉmʉkohopʉre kahtirã nipetise merã, ahko merã, nʉhkʉrĩ merã, ome merã, ʉmʉse merã, waiá, waikʉrã nipetirã merã, añuro te merã ehõpeo añuro nisetisama, ni werewã. Ati ʉmʉkoho nisetisere mahsirã nisama, marĩ yarã mahsirã. Yʉ mami, Poani (Higino Tenório), atiro ni ukukʉ niwĩ:

Meus avós contavam-me que desde o nascimento recebemos a proteção da vida realizada pelo Kumû e Bahsegʉ. 2 Eles são gestores de políticas cósmicas. O Kumû dá o nome à criança (menino e menina) utilizando seus conhecimentos e idiomas cosmológicos e mitológicos. Essas forças acompanham a vida da pessoa, mantendo-o em equilíbrio, seja no interior (alma/espírito/psique), no seu corpo ou em seus contatos com as condições e elementos não humanos: rios, florestas, terra, ar, firmamento, com seres visíveis e invisíveis que interagem e entram na vida humana com e sem sua permissão. Meu irmão maior (consideração), Poani, professor Higino Tenório, dizia:

“Ati ʉmʉkohore pehe ña´ase morekãsa. Añuro iña mahsĩ, mahsã nisere bahse ahporo nirõ wesa, Doatise bʉhkʉrã dohorẽri nirã. Ati ʉmʉkoho pehe tatipa kʉosa, toho nimikã ña´ase sahã yʉrʉkã te tatipapʉre. Toho we´egʉ bahsegʉ, añuri imisa ehõ nʉkõ, tuste kusami, ahpeye tatipakahãra wimagʉrẽ doatisehe wa´akã weri nigʉ, bahsesami wimagʉ kʉ mahsati uture, tohota wesami bahsariwi nirã mahsãre wetiro daregʉkerã. Bahsegʉ nisami, mahsãre iña nʉrõgʉ, kamotagʉ, ati ʉmʉkoho nisere tʉoñagʉ, were kahsagʉ, doatisere bahsegʉ nisami kʉã. Kʉ bahsesehe merã, ba´asehere bahse ahpokã, marĩ nisetirore bahse ahpokã wesami, ña´asehe doatisere kamotakãsami, kʉ bahsesehe merã.”

“O mundo é permeado de hostilidades entre seres, por isso é preciso a observação e controle da relação das pessoas com outras Gentes. As camadas do Universo são separadas, mas possuem passagens entre elas. Em seus agenciamentos 3 o Kumû o Bahsegʉ ‘estende esteiras de proteção sobre o chão’, para impedir a agressões dos seres habitantes de outras camadas do cosmo, para esconder e defender a alma de um recém-nascido no momento do parto ou aos participantes de uma cerimônia na maloca. Ele acompanha de perto as passagens importantes na vida das pessoas, preparando-as e protegendo-as, interpretando a origem e curando doenças. Ele descontamina e transforma alimentos e espaços, neutraliza agressões através de proteção como a recitação das forças cosmológicas” (AEITɄ 2005: 147-148).

Mahsirã marĩ nirã, ati ʉmʉkoho kahãse nisere, mahsã na nisere mahsirã nirã wesama. Toho we´erã, wimagʉrẽ, mahsãtihi dʉhporopʉta bahsesama, kʉ pahkore bahsemama, kʉ wamerẽ bahsesama, ohpẽkorẽ bahsesama, wuasehere bahsesama, moã, bia, wai, waikʉrarẽ, sirĩsehere bahse peokãsami, wiserire, mahkãrirẽ, beti-ba´asere bahse peokãsami, ahko ehtoasere, bahsatihi dʉhporo, bahsa boretõkeakã bahsesami, mahsã werikã bahse tʉosami.

Os gestores de políticas cósmicas possuem conhecimentos e capacidades de manejar as forças da natureza e humanas. Dentro dessa compreensão a proteção da pessoa começa já na gravidez de sua mãe e continua durante o parto, na escolha do nome, no leite materno, sal e pimenta, peixe e da caça, casa e aldeia, tempo, bebida. Protege das forças negativas presentes nos deslocamentos até os rios para o primeiro banho. Bahsegʉ pacifica as vidas presentes nos instrumentos musicais que se encontram guardados em casa; Bahsegʉ protege as pessoas que participarão da festa, os tipos de comida que serão distribuídas, das abluções matutinas dos bayaroá para purificação interna, as dietas alimentares antes, durante e depois de cerimônias até chegar ao momento de enviar o espírito do falecido para outro mundo (dos mortos), etc.

Yʉ Pahko-Mahkʉ, Pedro Sarmento Lemos yʉre werewĩ ateré, 2015 nikã. Teré pehkasãye merã tʉo mitikãña niwĩ, mehõ ohamiña niwI teré weregʉ. Ohamiña ateré, bero yʉ porãre wiaya mʉ ohakere, ni yʉre werewĩ. Wiatisa ohopʉ teré.

O narrador desta versão narrada é meu Pako-Makʉ (“filho de mãe”), Pedro Sarmento Lemos. Foi ele que no ano de 2015 contou esta história e pediu que eu escrevesse no papel, mas não gravasse em nenhum tipo de aparelho eletrônico. Ele me repassou essa narrativa com a condição de que entregasse o texto escrito para seus filhos. Ainda não consegui devolvê-lo.

Ate kʉ yʉre werekere pehe mahsã kurari uku weresama, Yaiwa-poeakarã, Merêwarã ʉhtãpa kahãra, Siripa kahãra. To nikarõ kihti mo nímirõ, nikãre mehẽkã na ukusehe morẽsa. Ate kihti tʉoro bahuro tʉose mehẽta nisa, te kihtiri tʉoñe bahsero nirõ wesa, mahsãre wetiro darerã na bahsesehe nisa atea, toho nikã marĩ nise mahkãrirẽ, marĩ kahti ʉmʉkohorire, ati ʉmʉkohore bahsesehe nisa atea.

Essa mesma história é narrada por pessoas dos diversos grupos da região do Triângulo Tukano — Iauareté, Taracuá e Pari-Cachoeira. Por isso, são narrativas semelhantes, mas com muitas variações. Essa história não é apenas para ser memorizada, mas serve para que, assimilando essa fórmula que é de proteção da vida, comece a fazer a proteção da vida pessoal e coletiva, como também dos lugares donde vivemos, no tempo, espaço e com os seres que habitam esses lugares.

Pʉã ñemerõ kahãse merã ohanowʉ. Yepa-mahsãye ukura na ukuse merã tʉoñeato nigʉ, pehkasãye diakʉhʉ ukurã kerã tʉoñeato nirã. Noa tere mahsirã atirope niwʉ ni tʉoñarasama. Ate kihti werese niro we´e. Atiro we´e bahsewa ni mahsĩtisa, kʉ mahsĩsehe kerãre were mahsĩtisa. Tere mʉhsã iñaña.

O texto está organizado em duas línguas: Tukano e língua portuguesa. Sem dúvida que os falantes da língua tukana entenderão diferente, profunda e superficialmente, dependendo do tempo de contato ou não com estas forças e seus gestores cosmológicos. Este texto narra uma história, por isso, não pretende ensinar como o sábio manipula as diversas compreensões de mundos que atingem a vida da pessoa e dela para com outros seres. Vejamos a narrativa.

Diroá, Handeyʉ “Pahko-Por㔠níparã

Diroá são “filhos de mãe” do Handeyʉ 4

Diroá, Handeyʉ Pako-Porã níparã.

Diroá são “filhos de mãe” do Handeyʉ.

Wẽherĩ mi wa´aparã.

Diroá pegaram seus puçás 5 e foram,

Yaiware wẽhe amerã wa´arã.

Mataram os pajés (avós do Oâ-mahsʉ).

To diahkʉ nisama ni,

Calcularam onde os pajés estariam,

Wa´aparã wipʉ.

Foram direto a casa.

Bʉhkʉo nikõ, nipo wipʉre.

Lá se encontrava só a avó do Oâ-mahsʉ.

Diroare kotego wee, nipʉ.

Ela lhes disse: estou esperando aos Diroá.

Atiahã niaparã,

Eles chegarão aqui,

Wẽherã atirã, nipo.

Para matar os pajés.

Marĩsama na mahã, níparã Diroapea.

Os Diroá disseram: eles não virão.

Na nimirãta, toho níparã.

Sendo eles mesmos.

Wipʉ sahã Oãrĩ puhtipe parã.

Adentraram na casa e brincaram, tocando as flautas de ossos.

Dutiya, nipo, kohkopea.

A avó do Oâ-mahsʉ disse: fujam!

Ba´asome, níparã Diroápea.

Diroá responderam: eles não irão nos comer [matar].

Sohperire wẽherĩ merã kamota tohaparã.

Eles já haviam cercado as portas com puçás.

Uaro merã ati, wʉkãti wẽheripʉ dohkesã nʉkãparã, yaiwa pea.

Os pajés chegaram muito bravos voando e caíram dentro dos puçás.

Na pʉarã pʉre mima mʉhaparã, Diroápea.

Os Diroá levaram os dois pajés presos para cima.

Uyugʉpe wʉhapeha parã, nuriãwaparo digʉpea.

Pousaram na copa do abacateiro, mas ele quebrou.

Toho weerã, merẽgʉ waaparã, nuriãwaparo tigʉkerã.

Voaram par cima do pé de ingá, mas também quebrou.

Toho weerã simiõgʉpʉ eha peha parã.

Foram pousar na copa do uacuzeiro [árvore mais alta e forte].

Topʉ nikarã, bupuma dihaparã,

Daí pularam para baixo,

Na ñehkõkoho tiropʉ.

Caíram perto da avó deles.

Yo´parã wẽherĩpʉ sãyãrare, wẽrikarãre.

Carregavam os pajés mortos em seus puçás.

Ko koho, nare ñayagõ nipo:

Vendo-os mortos, a avó disse:

Diakhʉta koãrã wa´aya, nipo.

Levem e os joguem fora.

Wihtõ diahkʉ míparã.

Dos pajés mortos só aproveitaram as plumas.

Te merã mahsã puhtiparã, Diroápea.

Com as plumas, os Diroá se multiplicaram.

Yaiwa ahkabihirã, atiro niparã:

Os irmãos dos pajés, assim disseram:

Mari mami sʉmʉarẽ Diroá wẽhekama, niparã.

Os Diroá mataram a nossos irmãos maiores.

Yawa peru samʉrã atiato, niparã Diroáre.

Um dia os pajés [do Oâ-mahsʉ] convidaram os Diroá para a festa do caxirí 6 .

Handeyʉ kurakahãra na wihtõ wiasĩririkura.

Os Diroá — “filhos de mãe” — do Handeyʉ queriam devolver as plumas para os pajés.

Kahpi bahuari kurare narẽ ba´arã, nípara yaiwapea.

Os pajés estavam com plano de matar aos Diroá no momento em que estivessem sob o efeito do caapi [bebida alucinógena].

Toho wekã mariye wato mahã, níparã na yaiwapea.

Diziam: vamos tomar de volta nossas plumas.

Wiati karã mahã tere narẽ, níparã Diroápea.

Sabendo disso os Diroá decidiram não devolvê-las mais.

Na ye ʉpʉrire apeye mi mahamikeho kãparã:

Transformaram seus corpos em outras realidades:

Yõri ʉpʉ kʉorã waaparã

Tornaram-se seres de corpos elétricos.

Barari ʉpʉ kʉorã waaparã.

Corpos que explodem.

Asiri ʉpʉ kʉorã waaparã.

Corpos de alta temperatura.

Ñohkoãri ʉpʉ kʉorã waaparã

Corpos rígidos (elásticos, como pneu).

Sʉẽri ʉpʉ kʉorã waaparã.

Corpos amargos.

Bʉhtiri ʉpʉ kʉorã waaparã.

Corpos duros.

Mukuru ʉpʉ kʉorã waaparã.

Corpos travosos.

Na yaiwa pea eha nʉkãparã.

Os pajés chegaram perto dos Diroá para atacar e matá-los.

Nare ba´asirirã poteõti parã,

Mas não conseguiram.

Wa´a parã, poteótiparã, wẽhetiparã.

Não aguentaram e foram.

Nayé tohapã mahã.

As plumas tornaram-se propriedades dos Diroá.

Toho wa´akã na pʉarã diroá ukuparã:

Os Diroá conversaram entre si:

Marirẽ arã añurõ wesirĩtima, niparã.

Esses (pajés) querem nos matar.

Diakhʉta wẽhe koãkarã, nípara.

Vamos matá-los primeiro.

Bʉpo tiropʉ wa´aparã.

Subiram até ao trovão.

Na ñehkʉ nipʉ bʉpó.

Trovão é avô deles.

Ʉhtãbohopihĩrẽ serĩparã.

Pediram-lhe arma [espada] de pedra quartzo.

Oó sirĩti mipʉ, kʉpea nare.

Ele [trovão] não queria entregar a arma.

Topurikãrẽ, añurõ ahpeapa, nipʉ.

Mas ao entregar recomendou: brinquem bem.

Añuripihĩ ta yʉre wiapa, nipʉ.

Devolvam-me a arma bem limpa.

Ne dí wañripihĩ wiatikaña, nipʉ.

Sem manchada de sangue.

Na ti pihĩre mima dihatiparã,

Eles desceram com aquela arma.

Bʉhpo dohkakã turire dohke pehaparã.

Caíram no patamar abaixo da morada do trovão.

To ti pihĩre wehe mahamikeho,

Ali movimentaram a arma com força.

Pehka porãti keho nʉkõ,

Colocaram força de um raio nesse movimento.

Numirõti nʉkõ,

Colocaram a força da invisibilidade e do esquecimento [por parte dos inimigos],

Tu mahamikeho dihoparã.

Lançaram a força para baixo.

Bero na ñehkokohore serĩtiãparã:

Feito isso perguntaram à avó:

Bʉhsʉati, níparã.

A senhora ouviu o barulho?

Sahatiroakã bʉhsʉami, nipo kokohopea.

A avó disse: ouvi um barulho muito distante.

Na ñekʉ tiropʉ omamʉhãpara.

Subiram novamente até perto do avô.

Toho werã yʉkʉbui dohke pehaparã.

Descendo caíram no nível da copa das árvores.

Beró na ñehkokore serĩtiãpara, bʉhsiati nirã.

Foram com a avó para perguntar se ouviu o barulho.

Ʉhpʉti bʉhsʉpʉ, nipo nare.

Fez um barulho muito forte, disse a avó.

Bero mahami mʉhaparã taha.

Subiram novamente.

Wʉ maha dihati ati nukuka dohkekeaparã.

Dessa vez caíram no chão.

Toho wa´akã na yaiwa wẽri petia wa´aparã.

Assim mataram todos os pajés.

Ti pihĩrẽ koe toha, mi mʉhã miparã.

A arma ficou manchada de sangue. Eles a limparam e a levaram ao avô.

Na ñehkʉ ʉatipʉ mahã.

O avô não quis a arma de volta.

Mʉhsã merã tohakãto, nípʉ.

Ele disse: fique com vocês essa arma.

Toho we´erã mi dihatiparã,

Os Diroá desceram com a arma para a terra.

Na ya pihĩ tohapã.

A arma ficou na posse deles.

Ʉhtã bohopĩ, yaipihĩ:

Tornou-se arma de pedra quartzo, arma de pajé.

Yõrĩ pihĩ

Arma 7de efeitos elétricos.

Barari pihĩ

Arma que explode.

Asiri pihĩ

Arma de alta temperatura.

Ñohkoãri pihĩ

Arma rígida.

Sʉẽri pihĩ

Arma amarga.

Bʉhtiri pihĩ

Arma dura.

Mukuri pihĩ

Arma travosa.

Na niatore mehekã niro waakã weepã.

Depois transformaram o ambiente bom aonde eles andarão.

Yõrĩ imisa

Esteira 8 elétrica.

Barari imisa

Esteira que explode.

Ahsiri imisa

Esteira de alta temperatura.

Ñohkoãrĩ imisa

Esteira rígida.

Sʉẽrĩ imisa

Esteira amarga.

Bʉhtiri imisa

Esteira dura.

Mukurĩ imisa

Esteira travosa.

Ato bero mahsʉ niatohore ahpo nʉkõsami:

Depois cria um ambiente equilibrado:

Mʉ yaigʉ,

Com lança-chocalho,

Ʉhtã bohogʉ,

Lança-chocalho de pedra-quartzo.

Yaígʉ ohko sihtikʉ

Lança-chocalho transparente.

Tu sestegʉsa

Com lança-chocalho espalha as forças de proteção.

Bero muhĩpu ye oógʉsa mahã.

Depois protege com as forças do sol.

Muhĩpu mahã poari beto:

Com o cocar da luz do sol.

Numirõ tiro beto,

Cocar de invisibilidade, de esquecimento;

Horitiri beto,

Cocar de flores,

Pehká ahsiri beto,

Cocar quente-luminoso,

Pehká buhtirii beto

Cocar de fogo branco,

Te betori merã tusteé nʉkõkayã,

Com esses cocares espalha (ventila) a proteção,

Tusté nʉkõkãya, yʉsʉowe nʉkoña,

Espalha a proteção tornando ambiente bem refrigerado,

Mʉ niatohore.

Lugar onde se vai viver.

Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari?

A Volta dos Diroá: uma virada ontológica?

Ato yʉ wereke dʉhporo niwʉ ahpeye ukusehe: Pahko-Porã niparã Handeyʉ, Oâ-mahsʉ merã. Na pʉarã numiã weresãra wa´aparã. Dia-patua numiã niparã.

A narrativa apresentada é uma parte de uma narrativa maior em que duas personagens aparecem: Handeyʉ e Oâ-mahsʉ. Eles são Pako-Porã (“filhos de mãe”). Em certo momento há desentendimentos por causa do “encantamento” das mulheres que eles paqueravam.

Oâ-Mahsʉ ʉrĩgʉ nipʉ, toho we´erã numiã tʉsatipãra kʉrẽ. Handeyʉ pea añugʉ nipʉ, numiã na ʉaripehagʉ. Toho wegʉ nikã nʉmʉ peru sirirã atiá ni weregʉ ehapʉ na numiãre. Ohko piori nʉmʉ ehaya, nipʉ. Handeyʉ ya wipʉ warimape, diakʉhʉ kahã ma níparo. Warã iña mahsiato nigʉ yuhkʉ dʉhpʉri merã keo nʉkõpʉ.

Gente-Mucura era um ser “fedorento”, rejeitado pelas mulheres. Handeyʉ, ao contrário, era um ser bonito, encantador das mulheres. Certo dia ele foi convidá-las para a festa. Para indicar o caminho por onde as duas mulheres deveriam caminhar até à sua casa, ele sinalizou com galhos.

Oâ-Mahsʉpe te dʉhpʉrire mi mahamikeheo nʉkõkãpʉ kʉya wipʉ wa´ato nigʉ. Toho we´erã Oâ-Mahsʉ tirope ehaparã na numia. Nikõ kahĩpo Oâ-Mahsʉya pugʉpʉ, toho we´ego ʉrĩsehe perĩpo ko ʉhpʉ nipetiro. Ahperopʉ nisa mariã ni iña mahsĩ dutia wa´aparã, pehtapʉ buaparã. Topʉ nipʉ Ʉhsô, marĩ ñehkʉ nipʉ kʉã. Kʉ na numiarẽ sã peãpʉ ahpesia parẽpʉ. Tope niparo Handeyʉ kʉ peru sirĩropea.

Gente-Mucura sabendo disso foi lá e inverteu a direção dos galhos. Assim as duas mulheres chegaram até a casa de Gente-Mucura. Uma delas deitou na rede de Gente-Mucura e o “fedor” pegou no corpo delas. Desconfiadas que estivessem no lugar errado as duas fugiram, desceram para o porto. Aqui aparece outra personagem chamada “Jacaré”. Ele é considerado “nosso Avô” (assim disse o narrador). Ele as levou para outro lado do rio, onde acontecia a festa organizada pelo Handeyʉ.

Na mumiã ehakã iñapʉ Handeyʉ, mehõ buha wehtirã, ʉrĩra niparã. Toho we´egʉ narẽ koepʉ te Oâ-Mahsʉ ʉrĩsehe na pẽrikere, na bʉha wehtisere koãpʉ. Bará añuro ʉmʉtise merã narẽ koepʉ, Handeyʉ, mahsã tʉsasehe noho bará merã narẽ koepʉ. Koetoha, na dehko sirĩ duhipʉ, ekati, tuhtua duhipʉ.

Quando as duas mulheres chegaram Handeyʉ viu que estavam tristes e fedorentas. Ele decidiu limpá-las do cheiro do Oâ-mahsʉ e tirar a tristeza. Para essa limpeza Handeyʉ utilizou as melhores puçangas, mais cheirosas, que possuem maior força de atração. Após limpá-las, Handeyʉ sentou-se no meio delas na festa, cheio de poder e orgulhoso pela sua beldade.

Dahari tero nikã ehapʉ Oâ-Mahsʉ, na numiarẽ sirutugʉ. Handeyʉ pe Yaiware wehẽ koãkã duhtipʉ kʉrẽ. Toho we´erã yaiwa kʉrẽ ñe´ema hoa pohtaño pʉ dohke õparã, to wẽripʉ kʉã.

Ao meio dia chegou o Gente-Mucura procurando as mulheres. Handeyʉ pediu que os pajés o expulsassem e o matassem. Os pajés o agarram e jogaram contra os pés de tucumã. Assim ele morreu.

Toho wa´abosa ni mahsĩpʉ kʉ Oâ-Mahsʉ. Toho we´egʉ wihagʉ kʉ ñehkõkohore werepʉ: yʉ bahutikã iñagõ wahatoropʉ iñagõsa mʉ nipʉ, ti waharopʉ di sãyakã, yaiware pihiya, na Handeyʉre wehẽra wa´akã, nipʉ. Kʉ duhtikaro we´epo kʉ ñehkokoho. Ti waharopʉ di sãyakã iñagõ yaiware pihipo, Handeyʉre wehẽ amẽ duhtigo, kʉ, numiã dehko sirĩ duhiri kura. To kʉ nigʉrẽ naye wehẽri merã ñe´e pãra na yawa, ñe´ekeho wʉma mʉhã uñugʉ buipʉ wʉha pehaparã, bero merẽgʉpʉ, to kahãra ta na niropʉ, topʉ wehẽparã kʉrẽ.

Gente-Mucura já suspeitava que pudesse acontecer isso com ele. Ao sair de casa disse à sua avó que se ele demorasse a voltar e aparecesse sangue na cuia, a avó deveria chamar os pajés para que viessem matar a Handeyʉ. A avó fez exatamente o que ele pediu. Quando viu sangue na cuia avisou aos pajés para que fossem matar o Handeyʉ que continuava na festa, dançando com duas mulheres. Os pajés pegaram o Handeyʉ com seu puçá, voaram para cima do pé de abacateiro, do ingazeiro e daí para o lugar deles, onde o mataram.

Te kihtire tʉopo Handeyʉ ñehkokoho. Handeyʉ Pahko-Porã Diroare weresãpo, wehẽ ame duhtigo. Ato bui yʉ werekaro ate yahpa werekãsehe niwʉ. Ate kihtiri serĩ mahsiharã marikã, Diroare nirã, wiorã nisama, oãmarã nisama, pamʉri mahsã nisama, mahsĩra, tʉoñarã ni, tuhtuarã nisama, añusere werã noho nisama, ña´ase nohõ werã nisama, nikarã niwã. Atere iñarã mahsã nisama ni tʉoña bosama ahperã, nitisama, mehẽkã nirã nohõ nisama, ahpeye nohõ suti sayãra nisama, mirikʉhkʉã wero nohõ, wehẽri wero nohõ wa´arã, busatise wero nohõ wa´arã, boreyu wero nohõ wa´arã nisama, mahsã bahsarã puhti warã nohõ nisama. Nikʉta nimirã mahsã puhtirã nohõ nisama, mehẽka suti saña, mehẽkã bahurã warã noho nisama, na Diroá.

A notícia da morte do Handeyʉ logo chegou aos ouvidos de sua avó. Ela convocou “filhos de mãe” do Handeyʉ, que são os Diroá. A parte que eu estou utilizando neste texto é uma continuação dessa narrativa. Os pesquisadores das culturas do rio Negro, quando tratam dos Diroá, explicam que eles, encantados, míticos, grandes pensadores, são possuidores de poderes para fazer o bem e o mal manejando-os para transformar as atitudes negativas em positivas. Lendo essas narrativas o leitor pode imaginar que eles sejam humanos, mas não são, são seres com diversas roupagens, de pássaros, de puçás, de plumas, de luzes, instrumentos musicais. São seres que se multiplicam e assumem diferentes formas.

Ato yʉ ohake ahperopʉ marirẽ miasehe nohõ nisa, ahpe ʉmʉkohopʉ. Mahsãye diakʉhʉ ukura mehẽta we´e mariã, marĩ kahtiri tatia ahpe tatia kahãsepʉ wahkura we´e. Pehkasã buerã, marĩ nisekerãre buepã, dero nirã nohõ niti mahsʉ ni buepã. Marĩ ñehkʉsʉmʉã kerã mahsĩpa te nohõre, ati ʉmʉkoho nisere mahsĩpa, ahperã nohõ na kahtise kerãre mahsĩpa. Tere mahsirã ta, tere ahpo nʉkõpã, añusehe marirẽ ʉasãra.

Através da narrativa apresentada o leitor entra em outro mundo cósmico e noutro nível ontológico. Não estamos falando, originalmente, das forças humanas, são outras realidades existenciais cósmicas. Dentro do campo do estudo da Filosofia grega e ocidental “ontologia” refere-se ao “estudo do ser”, “natureza do ser”, “estudo da existência e da realidade”. Nossos avós também possuem suas compreensões do cosmo e seres que revoam nesse cosmo. Nessas realidades eles manejavam a favor da vida e contra a vida.

Yʉ kihti wereke popeapʉre ate nisa marĩ mahsĩ bose nohõ ni kuwʉ ato dohka bahuasere.

Destaco alguns conceitos e realidades que aparecem nas narrativas que estão muito próximos daquilo que a nossa vida acadêmica nos provoca a pensar e repensar:

Pahko-Porã ni uku noapʉ. Te wateropʉre Pahko-Porã wiosehe waro wateropʉre bahuapã, amerĩ amewehẽse watero, wehẽ amerã atirã, na Pahko-porãre mairã. Ato kãteropʉre marirẽ tʉoñaro nisa: noã nisari marĩ Pahko-Porã, marĩre mairã nohõ ni wahkʉse, nisa marirẽ.

Nessas narrativas cósmicas aparece o conceito Pako-Porã. As figuras e ações do Pako-Porã nessa narrativa aparecem em contextos de muitas dificuldades, conflitos, para matar o outro, por vingança pela morte de Pako-Makʉ — “filho de mãe”. Eles aparecem como parentes próximos por parte da mãe. Pako-Porã podem ser até mesmo aliados com finalidades específicas.

Kihti wereke wateropʉre bahuama, mehẽka bahuse suti sayãra, mehẽkã kahtise kʉorã: Yaiwa, Handeyʉ, Oâ-Mahsʉ, Diâ-patua, Bʉpô, Ñehko, Ʉhsõ. Ahpeye tuhtuase kʉorã nisama na. Te sutire mi dʉhkayu sayã ahperã dohorã noho nisama, na wahparãre wehẽrati nirã. Ahpetora busã, nikarota paharã wa´akã wesehe nohõ wakasã, wahparãre mahsoro.

Os Yaiwa (pajés), Handeiyʉ, Oâ-mahsʉ, Diâ-patua (mulheres; patas d’água), Bʉpô (trovão), Ñekô (avó), Ʉhsô (jacaré) são imagens de seres estranhos aos olhares humanos. Elas são forças que estão para além da matéria. Por isso, eles assumem várias formas. São capazes de assumir “corpos” em formas de puçás para aprisionar o inimigo, formas de plumas que se multiplicam.

Te kihti wateropʉre pehe mehẽka ameñasehe bahuamiapʉba, mʉhãse, dihasehe, wʉsehe, ditatisehe, werĩsehe, dí, pohta bahuamiapʉto. Na Yaiwa, Diroá na wahparãre wehẽrã ʉmʉarõpʉ diakʉhʉ mi mʉhã ma, yuhkʉpʉ ʉmʉasepʉpʉ, topʉ wʉ mahã mihi dihatira wehẽama na wahparãre.

Na narrativa aparecem muitos movimentos de subida, descida, queda, voo, barulhos, mortes, sangue, espinhos. Os Yaiwa, assim como os Diroá, quando pegam suas presas sempre levam para cima, nas copas das árvores, árvores cada vez mais resistentes, do abacateiro ao uacuzeiro e nas quedas é que matam suas presas.

Ate diasasehe na bahurẽketa nisa, marĩ ñehkʉsʉmʉã na mahsisehe bahurẽkea, te merã ta ahpeye ʉmʉkohoripʉ sihasama bahserã. Nakerã mehẽka nise ʉhpʉri marĩre ehõ nʉkõsama: ñiorĩ ʉhpʉ, borori ʉhpʉ, ahsiri ʉhpʉ, ñohkoãri ʉhpʉ, sʉẽri ʉhpʉ, bʉhtiri ʉhpʉ, mukuri ʉhpʉ. Marĩre ehõ nʉkõsama: ñiorĩ pihĩ, borori pihĩ, ahsiri pihĩ, ñohkoãri pihĩ, sʉẽri pihĩ, bʉhtiri pihĩ, mukuri pihĩ.

Essas realidades de transformação de um ser a outro ser mais difícil de ser atingindo é uma grande estratégia dos que manejam os poderes cósmicos. Vejamos aqui diversas formas: tornar-se um ser com corpo elétrico, com corpo que explode, em corpo de alta temperatura, rígido, amargo, duro e corpo travoso. Assume também corpo/ser em forma de arma: arma com efeito elétrico, que explode, de alta temperatura, rígido, amargo, duro e travoso.

Toho we´erã na Yaiwa wehẽ mahsĩtipã na Diroare, ahpeye ʉhpʉri dohokã wa´apã. Ahpeye merã kamota wa´apã.

Assim os pajés que queriam matar os Diroá não conseguiram, porque os Diroá já tinham se tornado seres com outros efeitos. Por isso, os Yaiwa não conseguiram atingi-los. Eles já estavam protegidos com outras armaduras.

Ato marĩ ʉtakuri pati kerãre mehẽka ahpo kukãpa, marirẽ kamotarã. Ñiorĩ imisa, borori imisa, ahsiri imisa, ñohkoãri imisa, sʉẽri imisa, bʉhtiri imisa, mukuri imisa merã eõtu nʉkõpã marĩ kahtirore, marĩ niatohore.

O chão onde pisamos também passa pela transformação, para a proteção da vida. Assim, na narrativa pode-se entender que o solo é transformado em campo elétrico, campo que explode, de alta temperatura, rígido, amargo, duro e travoso.

Na mahsirã bahserã ati ʉmʉkohore añuri ʉmʉkoho ehõ nʉkõsama, yaigʉ, ʉhtã bohogʉ, yaigʉ ohko sihtikʉ merã. Tigʉ merã tuste nʉkõsami marĩ niatohore, marĩ sihatore. Bero muhipu ye osami, muhipu mahã poari beto, mumirõ tiro beto, ohoritiri beto, pehka ahsiri beto, te betori merã tuste nʉkõsami, marĩ niatohore.

Os gestores de políticas cósmicas conseguem tornar um ambiente bom para viver bem. Utilizando seu lança-chocalho, de pedra quartzo, lança-chocalho transparente, espalha as forças de proteção em todo o ambiente onde vai viver. Depois com as forças do sol, com cocar da luz, cocar de invisibilidade, de poder de esquecimento, com cocar de flores, com cocar quente-luminoso, com cocar de fogo branco, com todos esses cocares espalha a proteção aos ambientes, ventila com as forças de proteção ao ambiente onde se vai construir a vida.

Uku yahpa darero

Considerações finais

Diroá mahami tohatirã wesari, nisehe marĩ mahsã nisetise ukuro niro wesa. Ato Pahkasehe buese wiseripʉre. Atokãteropʉre marĩ pamʉri mahsã parã merã paharã te wiseripʉre sahã buekãkãpʉre, Pahko-Porã weronohota nirõ wesato te kerã ni tʉoñarõ nisa. Atokãteropʉ noa nohõ nisari mari Pahko-porã? Pehkasã marirẽ maĩ uku bohsarãta nísama, atopʉ buerã atia mʉhsã kerã nirã noho ta Diroá weroho marirẽ mairã nisama ni tʉoñaro nisa. Ahpero ma tʉoñaro nisa taha: nisama marirẽ wehẽ koãsirĩra kerã. Te buesere duhtirã ta nikãsama, mehẽka dararo ʉasa ni mahsitirã nohõ, na nisama marĩ tʉoñasere, marirẽ wehẽra wero noho wesaama na.

A volta dos Diroá: uma virada antropológica é lance novo no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da ufam. A entrada de vários estudantes indígenas de diferentes povos, baseando-se na narrativa aqui utilizada, pode-se indicar que está ocorrendo a prática do conceito Pako-Porã. Quem seriam Pako-Porã, hoje? Podem ser os não indígenas ou indígenas que nos convidam para entrarmos na Universidade. Como os Diroá, nós entramos para lutar, avançar, vingar e matar. Por outro lado, precisamos estar atentos, pois do lado de lá também estão os Yaiwa perigosos que podem nos matar. São os representantes legais do sistema de pensamentos universitários.

Marĩ pamʉri mahsarẽ ehõpeotirã kerã nisama pahkasehe Buese wiseripʉre, na wiorãre uku koterã paharã nisama, marirẽ na diho nʉkõsere were kahsarã nisama. Nisari na?

Os pensamentos tradicionais existem e perpetuam, pois existem os Yaiwa que lutam por eles e esses Yaiwa mataram muitos Pako-Porã do Diroá. Por que não dizer que os Yaiwa do sistema tradicional universitário possuem seus Pako-Porã que os representam e espalham suas ideologias?

Marĩ pamʉri mahsã atokãtero ma peheterãka ni, marĩ Pahko-Porã wero nohõ maikoterã, pehkasã kerã peheterãka nisama. Tere tuhtua yʉrʉ nʉkarãti nirãta mehẽka nisetirã marĩ nirõ ʉaro we´e, wʉsiharã wero nohõ, wʉ mʉhã, wʉ dihati wero. Marĩ ñehkʉ Bʉhpo merã ukuro nisa, kʉye wamo, kʉ tuhtuasere serĩ mi dihatiro nisa tuhtuarã ti nirã, ʉhtã bohopĩ, yaigʉ ohko sihtikʉhʉ. Muhipu tiropʉ tuhtuasehe amarõ nisa, kʉya mahã poari beto, horitiri beto, pehka ahsiri beto mi dihatiro nisa. Marĩye ʉhpʉrire mi mahamikehe nʉkorõ nisa, ñiosehe ʉhpʉri, borosehe ʉhpʉri, ahsisehe ʉhpʉri, ñohkoãsehe ʉhpʉri, sʉẽsehe ʉhpʉri, bʉhtisehe ʉhpʉri, mukusehe ʉhpʉri. Mari bue siharã sihato kerãre ahpo kuro nisa: ñiosehe imisari merã, borosehe imisari merã, ahsisehe imisari merã, ñohkoãsehe imisari merã, sʉẽsehe imisari merã, bʉhtisehe imisari merã, mukusehe imisari merã.

Nós também somos apenas um grupo de indígenas com nossos Pako-Porã não indígenas, nossos aliados. Para poder lutar e ganhar precisamos adentrar no campo das mobilidades, revoadas, subidas e descidas, para cima de árvores mais frágeis até chegar à copa do uacuzeiro. Precisamos conversar com nosso avô Bʉpô (trovão) para emprestarmos sua arma, a espada de pedra quartzo, precisamos assumir formas de vida de Yukʉ-Behsugʉ (Tukano: Yaigʉ) — lança-chocalho — precisamos subir para alcançar o cocar do sol, o cocar do calor, da luminosidade. Precisamos tornar nosso ser em ser elétrico, que explode, de alta temperatura, ser rígido (que não pode quebrar com facilidade), ser amargo, duro e travoso. Tornar os corredores da universidade em esteiras de proteção, tornando-os fortes como esteiras elétricas, que explodem, de alta temperatura, rígida e esteira amarga, dura e travosa.

Notas sobre a grafia e pronúncia das palavras em Tukano oriental

As grafias tuyuka e tukano adotadas não partem de propostas de unificação ortográfica, mas das comunidades e escolas indígenas a partir de consensos provisórios dos falantes e escritores sobre a melhor forma de escrever suas próprias línguas no rio Tiquié.

As vogais e consoantes adotadas são as seguintes, a, ã, b, d, e, ? g, h, i, i, k, m, n, o, õ, p, r, s, t, u, u, ʉ, w, y, agregado o símbolo de nasalidade. Existe uma harmonia nasal ou oral no morfema, se a vogal é oral a consoante sonora também o é, o mesmo ocorrendo com a vogal nasal. Este alfabeto remete às seguintes pronúncias (adaptado de Ramirez 1997):

a, i, u pronuncia-se como em português;

e, o pronuncia-se bem abertas, como em fé e avó;

ã, ?, i, õ, u pronuncia-se como em português, mas de forma nasalizada;

ʉ é uma vogal alta, não arredondada, nunca anterior como o i (como pronunciar o u com os lábios bem esticado, sem a arredondá-los);

p, t, k, b, d, g são consoantes surdas que têm pouca variação alofônica;

ge, gi pronuncia-se como em guerra ou guitarra;

t, d nunca são palatalizados, ti, di, te, de nunca se pronunciam como txi, dji, txe, dje;

b, d têm realizações que variam conforme o contexto nasal ou oral e se estão no começo da palavra ou em posição intervocálica;

s pronuncia-se sempre como sala, nunca como em casa;

h pronuncia-se como em inglês, hat ou house;

y pronuncia-se como em inglês yes;

ñ corresponde ao y em ambiente nasal, pronuncia-se como português nenhum;

r pronuncia-se como em caro;

w pronuncia-se como vaca afrouxando-se a articulação, ou como o w em inglês sem arredondar os lábios;

r, g nunca aparecem no começo das palavras.

Reconhecimentos: O presente texto foi preparado para utilização numa roda de conversa no Centro de Medicina Indígena – CMI, na cidade de Manaus – Amazonas. Agradeço ao professor Gilton Mendes dos Santos pela leitura e sugestões ao texto.

Notas

[1] O nome mitológico dos Tuyuka é Ʉtãpinopona (ʉtã = pedra; pinó = cobra; poná = filhos) = ‘filhos-da-cobra-de-pedra’. Nesse texto utilizarei a tradução em língua tukano: Ʉhtãpirõporã.

[2] Baserige (tuyuka), bahsesehe (tukano). Na língua portuguesa referia-se a essas ações com o nome de “benzimento”. Estudando juntos com os professores Márcio Silva, Adriana Testa e Carlos Dias, sentimos que poderíamos pensar outra nomenclatura para benzimentos (português). A partir disso eu (Justino) comecei utilizar:gestores de forças cósmicas para dizer basera (tuyuka) e bahserã (tukano); e agenciamento de forças cosmológicas para se referir aos benzimentos: baserige (tuyuka), bahsesehe (tukano).

[3] Em sua prática como agente das políticas cósmicas.

[4] O conceito pako-mahkʉ (“filho de mãe”, em língua tuyuka), faz eu lembrar o que meu avô (Buâ/Higino), contava: os povos com os quais não podemos casar são considerados nossos Pako-Pona (“filhos de mãe”, em língua tukano): Mʉteã (Carapanã), Edúria (Taiwuano), Pauará (Tariano), Konéa (Arapaso), Neroã (Mirititapuia), Wina (Desano). Numa explicação mais simples pako-makʉ é filho da irmã da minha mãe.

[5] Bapigʉ (tuyuka), weh?kʉhʉ (tukano), puçá (Nheengatu): rede de pesca. Tem tamanho pequeno, médio e grande.

[6] Peyuru (tuyuka), peru (tukano): bebida fermentada de mandioca, abacaxi, cana-de-açúcar, etc.

[7] Yõri pihi: espada que dá choque.

[8] Imisa kasero (tuyuka/tukano): esteira tecida com folhas do pé de inajá (Attalea maripa). Em Nheengatu se convencionou chamar de pari; Imisa kasero serve para cercar os peixes no igarapé, lago, etc., para depois mata-los.

Referências

AEITɄ. (2005). Wiseri Makane Niromakañe = Casa de Transformação: origem da vida ritual Ʉtapinopona Tuyuka. Histórias contadas por membros da aeitʉ, Associação Escola Indígena Ʉtapinopona Tuyuka. São Gabriel da Cachoeira AM – São Paulo SP: Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (foirn) – Instituto Socioambiental (isa).

Ramirez, H. (1997). A Fala Tukano dos Ye´pâ-Masa. Manaus: Inspetoria Salesiana Missionária da Amazônia, cedem.

Referencias

AEITɄ. (2005). Wiseri Makane Niromakañe = Casa de Transformação: origem da vida ritual Ʉtapinopona Tuyuka. Histórias contadas por membros da AEITɄ, Associação Escola Indígena

Ʉtapinopona Tuyuka. São Gabriel da Cachoeira AM; São Paulo SP: Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e Instituto Socioambiental (ISA).

Ramirez, H. (1997). A Fala Tukano dos Ye´pâ-Masa. Manaus: Inspetoria Salesiana Missionária da Amazônia, CEDEM.

Cómo citar

APA

Sarmento Lemos, P. y Rezende, J. S. (2017). Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?. Mundo Amazónico, 8(1), 133–149. https://doi.org/10.15446/ma.v8n1.66882

ACM

[1]
Sarmento Lemos, P. y Rezende, J.S. 2017. Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?. Mundo Amazónico. 8, 1 (ene. 2017), 133–149. DOI:https://doi.org/10.15446/ma.v8n1.66882.

ACS

(1)
Sarmento Lemos, P.; Rezende, J. S. Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?. Mundo Amazon. 2017, 8, 133-149.

ABNT

SARMENTO LEMOS, P.; REZENDE, J. S. Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?. Mundo Amazónico, [S. l.], v. 8, n. 1, p. 133–149, 2017. DOI: 10.15446/ma.v8n1.66882. Disponível em: https://revistas.unal.edu.co/index.php/imanimundo/article/view/66882. Acesso em: 21 sep. 2024.

Chicago

Sarmento Lemos, Pedro, y Justino Sarmento Rezende. 2017. «Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?». Mundo Amazónico 8 (1):133-49. https://doi.org/10.15446/ma.v8n1.66882.

Harvard

Sarmento Lemos, P. y Rezende, J. S. (2017) «Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?», Mundo Amazónico, 8(1), pp. 133–149. doi: 10.15446/ma.v8n1.66882.

IEEE

[1]
P. Sarmento Lemos y J. S. Rezende, «Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?», Mundo Amazon., vol. 8, n.º 1, pp. 133–149, ene. 2017.

MLA

Sarmento Lemos, P., y J. S. Rezende. «Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?». Mundo Amazónico, vol. 8, n.º 1, enero de 2017, pp. 133-49, doi:10.15446/ma.v8n1.66882.

Turabian

Sarmento Lemos, Pedro, y Justino Sarmento Rezende. «Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?». Mundo Amazónico 8, no. 1 (enero 1, 2017): 133–149. Accedido septiembre 21, 2024. https://revistas.unal.edu.co/index.php/imanimundo/article/view/66882.

Vancouver

1.
Sarmento Lemos P, Rezende JS. Diroá mahami tohatisehe: mehẽka marĩ nisere tʉoñaro nisari? = El regreso de los Diroá: ¿Un giro ontológico?. Mundo Amazon. [Internet]. 1 de enero de 2017 [citado 21 de septiembre de 2024];8(1):133-49. Disponible en: https://revistas.unal.edu.co/index.php/imanimundo/article/view/66882

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