Publicado

2017-09-01

Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio

Quality control of capillary straighteners containing ammonium thioglycolate

DOI:

https://doi.org/10.15446/rcciquifa.v46n3.69460

Palabras clave:

Alisante capilar, produtos cosméticos, controle de qualidade (pt)
capillary straightener, cosmetics products, quality control (en)

Autores/as

  • Rúbia Adrieli Sversut Curso de Farmácia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
  • Alini Delevatti Ferreira Curso de Farmácia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
  • Eveliny Letícia Moreira de Toledo Curso de Farmácia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
  • Leonardo Prates Céspedes Curso de Farmácia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
  • Nájla Mohamad Kassab Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Alimentos e Nutrição (FACFAN) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande-MS
  • James Cabral Vieira Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Alimentos e Nutrição (FACFAN) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande-MS

Considerando a demanda do mercado por conhecimento na área de alisamento capilar, é importante realizar o controle de qualidade de cremes alisantes, a fim de garantir a segurança dos usuários e dos profissionais da área de estética. Desse modo, o objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade de cremes alisantes capilares que contêm em sua formulação o tioglicolato de amônio. Foram analisadas dez amostras
de cremes alisantes.

Os testes realizados foram: doseamento do ácido tioglicólico e
de amônia, análise das características organolépticas e determinação do pH. Quanto ao teor de ácido tioglicólico, três amostras classificadas como de uso geral apresentaram quantidade acima do permitido. No entanto, todas as amostras (de uso geral e profissional) foram aprovadas quanto ao teor de amônia. Em relação à avaliação de pH, todas as amostras apresentaram valores acima do limite permitido. O uso de
produtos com concentrações inadequadas de tioglicolato de amônio e pH acima do permitido podem gerar reações adversas ao consumidor e danos aos fios de cabelo. Sendo assim, verifica-se a importância do controle de qualidade em produtos cosméticos para proporcionar a segurança e eficácia dos mesmos.

Considering the market demand for knowledge in the area of hair straightening, it is important to perform quality control procedures in smoothing creams in order to ensure the safety of its users and the aesthetic professionals. The objective of this study was to evaluate the quality of capillary straighteners that contain ammonium thioglycolate in their formula. Ten samples of hair straighteners were analyzed. The
tests performed were: dosing of thioglycolic acid and ammonia, analysis of organoleptic and pH determination. Regarding the thioglycolic acid content, three samples classified as of general use showed results above the allowed limit while all samples
(both of general and professional use) were approved as far as the ammonia content goes. As for the pH evaluation, all samples had values above the established limit.
The use of products with inadequate concentrations of ammonium thioglycolate and pH above the allowed limit can lead to adverse reactions to the consumer and cause damage to the hair strands. In conclusion, it is of the utmost importance to perform quality control procedures in these products in order to provide a safer experience while using them and avoid any possible adverse reactions.

Recibido: 13 de julio de 2017; Aceptado: 5 de septiembre de 2017

RESUMO

Considerando a demanda do mercado por conhecimento na área de alisamento capilar, é importante realizar o controle de qualidade de cremes alisantes, a fim de garantir a segurança dos usuários e dos profissionais da área de estética. Desse modo, o objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade de cremes alisantes capilares que contêm em sua formulação o tioglicolato de amônio. Foram analisadas dez amostras de cremes alisantes. Os testes realizados foram: doseamento do ácido tioglicólico e de amônia, análise das características organolépticas e determinação do pH. Quanto ao teor de ácido tioglicólico, três amostras classificadas como de uso geral apresentaram quantidade acima do permitido. No entanto, todas as amostras (de uso geral e profissional) foram aprovadas quanto ao teor de amônia. Em relação à avaliação de pH, todas as amostras apresentaram valores acima do limite permitido. O uso de produtos com concentrações inadequadas de tioglicolato de amônio e pH acima do permitido podem gerar reações adversas ao consumidor e danos aos fios de cabelo. Sendo assim, verifica-se a importância do controle de qualidade em produtos cosméticos para proporcionar a segurança e eficácia dos mesmos.

Palavra-chave:

Alisante capilar, produtos cosméticos, controle de qualidade.

SUMMARY

Considering the market demand for knowledge in the area of hair straightening, it is important to perform quality control procedures in smoothing creams in order to ensure the safety of its users and the aesthetic professionals. The objective of this study was to evaluate the quality of capillary straighteners that contain ammonium thioglycolate in their formula. Ten samples of hair straighteners were analyzed. The tests performed were: dosing of thioglycolic acid and ammonia, analysis of organoleptic and pH determination. Regarding the thioglycolic acid content, three samples classified as of general use showed results above the allowed limit while all samples (both of general and professional use) were approved as far as the ammonia content goes. As for the pH evaluation, all samples had values above the established limit. The use of products with inadequate concentrations of ammonium thioglycolate and pH above the allowed limit can lead to adverse reactions to the consumer and cause damage to the hair strands. In conclusion, it is of the utmost importance to perform quality control procedures in these products in order to provide a safer experience while using them and avoid any possible adverse reactions.

Key words:

Capillary straightener, cosmetics products, quality control.

INTRODUÇÃO

Os alisantes capilares são considerados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) como produtos cosméticos que têm a função de alisar, relaxar, amaciar ou reduzir o volume dos cabelos em um período determinado de tempo. Além disso, são produtos de registro obrigatório e que possuem diversas denominações, dentre elas: amaciantes, relaxantes e desfrisantes [1].

Conforme a Resolução n° 211/05 da ANVISA, os produtos utilizados para alisamento dos cabelos se enquadram na categoria de Produtos Cosméticos de Grau 2, isto é, são produtos que apresentam risco potencial, necessitando de indicações específicas, e cujas características exigem comprovação de segurança e/ou eficácia assim como informações sobre o modo e as restrições de uso [2].

A queratina, cuja estrutura corresponde a 91% do peso do fio de cabelo, é formada por numerosos aminoácidos, dentre eles os sulforosos como a cisteína [3]. Os aminoácidos são unidos através de ligações peptídicas estáveis e difíceis de se romper [4], as quais se formam através de ligações de hidrogênio, iônicas e dissulfeto, conferindo firmeza e flexibilidade ao fio de cabelo [5].

Dentre as ligações químicas existentes na estrutura do fio de cabelo, a ligação de dissulfeto é a que confere maior resistência à fibra capilar. Porém, os processos químicos de alisamento podem rompê-la, tornando a queratina tão maleável a ponto de conceder a possibilidade de dar-lhe o formato desejado [6].

Os alisantes que contém ácidos, como o ácido tioglicólico, agem no córtex do fio de cabelo. As cargas negativas, provenientes da ionização do ácido, irão desestabilizar as ligações entre os enxofres a ponto de rompê-las. Em seguida, os íons H+liberados, irão ligar-se aos enxofres para estabilizá-los. Após esses eventos químicos no processo de alisamento, os cabelos tronam-se flexíveis e mais fáceis de serem moldados no formato desejado [7].

Para manter o novo formato liso é necessário cessar a ação do produto e refazer as pontes dissulfeto, devolvendo parcialmente a resistência ao cabelo. Para isso, adiciona-se um neutralizante, o mais comum é o peróxido de hidrogênio, que irá reagir com os prótons H+ que antes estabilizavam os enxofres, formando moléculas de água. Em seguida, os enxofres voltam a ligar-se entre si refazendo as pontes dissulfeto e reestruturando o cabelo de acordo com o novo formato fornecido (figura 1) [7].

Esquema geral de alisamento químico [8]

Figura 1: Esquema geral de alisamento químico [8]

O tioglicolato de amônio (figura 2), que é a associação do ácido tioglicólico com o hidróxido de amônio, é bastante efetivo no processo de alisamento capilar, pois é um agente redutor que possui a capacidade de modificar a estrutura do cabelo desfazendo as ligações dissulfeto da cisteína que se encontram na queratina dos cabelos [9]. Apesar dos resultados desejados serem atingidos, seu uso está associado a possíveis efeitos adversos como irritações na pele, alergia, quebra e queda dos fios de cabelo decorrente do uso. Além dos usuários, os profissionais da área de estética também são afetados, pois ambos se expõem diretamente ao produto [10].

Estrutura química do tioglicolato de amônio

Figura 2: Estrutura química do tioglicolato de amônio

Conforme Wilkinson & Moore (1990) [11], a solução de ácido tioglicólico foi usada primeiramente para ondulação dos cabelos a frio na década de 1940. Somente anos mais tarde sua propriedade alisante passou a ser explorada, sendo que hoje possui diversas aplicações no mercado da cosmetologia, como depilatório corporal, alisante e colorante capilar [12].

É importante tomar os cuidados necessários durante a aplicação do produto no couro cabeludo, pois algumas substâncias químicas para alisamento capilar apresentam efeitos de irritação cutânea. Contudo, mesmo com a precaução em proteger a pele, ainda há relatos frequentes de casos em que indivíduos apresentaram irritações na pele e outras reações adversas [3].

De acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n° 3 de 2012, que estabelece as listas de substâncias que os produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes não devem conter, exceto nas condições e com as restrições estabelecidas, os produtos para alisar e ondular os cabelos deverão conter no máximo 8% ou 11% de ácido tiogli-cólico se forem de uso geral ou profissional, respectivamente. Já o valor de pH desses produtos deve ser entre 7 e 9,5 e a concentração máxima de amônia de 6% [13].

Atualmente, os produtos para alisamento e relaxamento dos cabelos têm demonstrado grande destaque no mercado brasileiro. Além das diversas denominações, trazem propostas de transformações definitivas na estrutura dos cabelos, prometendo excelentes resultados [14]. Considerando a alta demanda do público por esse produto, é de suma importância realização de testes de controle de qualidade, pois a garantia de que os níveis dos seus componentes estão em conformidade com os critérios da ANVISA proporciona segurança aos usuários e aos profissionais que os utilizam.

Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade dos cremes alisantes contendo tioglicolato de amônio disponíveis no comércio varejista do município de Campo Grande - MS. Para isso, foram realizados o teste de doseamento do ácido tio-glicólico e da amônia, determinação do pH, a análise do rótulo e das características organolépticas dos produtos.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizadas dez amostras de cremes alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio de diferentes marcas e preços, adquiridas aleatoriamente no mercado varejista do município de Campo Grande - MS. Dentre essas dez amostras, oito (A1, A2, A3, A4, A5, A6, A7 e A8) eram classificadas como de uso geral e duas (P1 e P2) como de uso profissional.

Os equipamentos utilizados foram: medidor de pH de bancada modelo UB-10 (Denver Instrument*), agitador mecânico modelo TE-148 (Tecnal*), balança analítica (Gehaka*), estereomicroscópio (BEL equipamentos LTDA*).

Os ensaios analíticos empregados na avaliação da qualidade dos alisantes capilares, realizados de acordo com a RDC n° 3 de 2012 [13] e o Guia de Controle de Qualidade de Produtos Cosméticos [15], encontram-se descritos abaixo:

Análise Organoléptica

Neste teste foi analisada, através do estereomicroscópio, a aparência de cada amostra. Também foi verificado o odor, possibilitando o reconhecimento primário do produto [13].

Análise do rótulo

Foram verificados os rótulos de cada amostra, dando ênfase nos itens relacionados a concentração máxima, limitações, requerimentos, condições de uso e advertências que devem constar no rótulo de acordo com a legislação vigente [13].

Determinação do pH

A leitura foi realizada em triplicata para cada amostra, utilizando medidor de pH de bancada devidamente calibrado com a solução-tampão de pH 4,0 e 7,0. Após as análises, foram calculados as médias aritméticas e os desvios-padrão (DP) [15].

Doseamento de ácido tioglicólico

O teor do ácido tioglicólico foi determinado por titulação iodométrica direta, a qual é baseada na reação de oxidação do ácido tioglicólico pelo iodo em meio ácido. Para cada amostra pesou-se, em triplicata, o equivalente a 11 g do creme. Em seguida, foram adicionados 50 mL de água purificada e a solução resultante foi agitada por 5 minutos em agitador magnético. Logo após, adicionou-se cinco gotas do indicador vermelho de metila, até a obtenção de coloração amarelo claro. Posteriormente, acrescentou-se 10 mL de HCl 0,05M, até a amostra apresentar coloração rosa claro, em seguida adicionou-se 2 mL de suspensão de amido 5% (p/v) recentemente preparada como indicador. Por fim, realizou-se a titulação com solução padronizada de iodo a 0,05M (fator de correção próximo de 1,0). Para o cálculo do teor do ácido tioglicólico, utilizou-se a equação 1, conforme preconizado no Guia de Controle de Qualidade de Produtos Cosméticos [15]:

Onde:

C = concentração (p/p) de ácido tioglicólico;

V = volume da solução de iodo 0,05M utilizado, em mililitros (mL);

Fc = fator de correção da solução de iodo 0,05M;

m = massa da amostra em gramas (g).

Doseamento de amônia livre

O teor de amônia livre foi determinado baseando-se na reação de neutralização que ocorre entre um ácido forte e uma base fraca, sendo utilizado vermelho de metila como indicador. Foram pesados, em triplicata, o equivalente a 11 g do creme que foram dissolvidos em 100 mL de água purificada e agitados por 10 minutos em agitador magnético. Em seguida, foram acrescentadas três gotas de vermelho de metila como indicador. Por fim, foi realizada a titulação com solução padronizada de ácido sulfúrico 0,5 M (fator de correção= 0,92). A determinação da concentração de amônia livre (NH3) foi realizada através do método B, descrito no Guia de Controle de Qualidade em Produtos Cosméticos [15], sendo calculada através da equação 2, demonstrada a seguir:

Onde:

C = concentração (p/p) de amônia (NH3);

V = volume de ácido sulfúrico 0,5M utilizado na titulação da amostra, em mililitros (mL);

Fc = fator de correção do titulante;

m = massa da amostra em gramas (g).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características organolépticas

Os resultados obtidos nos ensaios organolépticos das amostras analisadas encontram-se na tabela 1.

Tabela 1: Características organolépticas das formulações analisadas.

UB - Úmida brilhosa; UO - Úmida opaca; B - Branco; A - Amarela; FC - Forte característico; MC - Moderado característico; LC - Leve característico; PR - Perfumada; NGA - Não há grumos e arenosidades; GA - Grumos e arenosidades; P - Pegajosa; C - Cremosa; E - Elástica; A1-A8: amostras de uso geral; P1-P2: amostras de uso profissional.

A figura 3 traz a análise macroscópica dos cremes alisantes estudados. Conforme observado nessa figura, constatou-se que nove das dez amostras apresentaram-se como cremes homogêneos e com coloração branca característica. Somente a amostra A8 (figura 3) apresentou uma coloração amarelada que pode estar relacionada com a separação de fases ou a quebra da emulsão, sugerindo instabilidade física da formulação e o consequente comprometimento da eficácia do produto [16].

Análise macroscópica dos cremes alisantes, evidenciado a coloração amarelada sugestiva de separação de fases (instabilidade física) da amostra A8.

Figura 3: Análise macroscópica dos cremes alisantes, evidenciado a coloração amarelada sugestiva de separação de fases (instabilidade física) da amostra A8.

Cremes alisantes são normalmente emulsões do tipo água em óleo (A\O) ou óleo em água (O/A) e, por esse motivo, costumam conter mais de um agente tensoativo (surfactante ou emulsionante) em sua formulação. Esses adjuvantes farmacotécnicos possuem a finalidade de manter a emulsão estável através da formação um filme interfacial ao redor das gotículas da fase dispersa, evitando que elas se aproximem umas das outras, isto é, sofram coalescência [16]. Todas as amostras analisadas continham tensoativos em sua composição, conforme observado na tabela 2.

Tabela 2: Descrição dos tensoativos presentes nas amostras de alisantes capilares analisadas.

A1-A8: amostras de uso geral; P1-P2: amostras de uso profissional.

No entanto, a amostra A8 foi a única que apresentou a seguinte combinação de tensoativos: lauril sulfato de sódio (tensoativo aniônico), álcool cetoesterearílico etoxilado (Cetareth 20", tensoativo não iônico) e cloreto de cetrimônio (tensoativo catiônico). Dessa forma, a instabilidade dessa emulsão pode ser atribuída a uma provável incompatibilidade entre esses tensoativos, uma vez que a adição de um agente tensoativo catiônico (cloreto de cetrimônio) a uma emulsão estabilizada com um tensoativo aniônico (lauril sulfato de sódio) pode resultar em quebra [16]. As demais formulações não apresentaram agentes tensoativos de cargas opostas, o que pode justificar a estabilidade dessas emulsões.

Em relação ao odor, as amostras A1, A2, A3, A6, A8 e P2 possuíam um cheiro fortemente característico de amônia, sendo que, a amostra A8 mostrou-se capaz de promover irritação nas mucosas nasais e ardência nos olhos de todos os autores durante os experimentos, sendo necessário o uso de óculos de proteção durante sua análise.

As amostras A4, A5 e A7 apresentavam odor considerado moderado em comparação com as amostras citadas anteriormente. Somente a amostra P1 não apresentou odor característico de amônia, possuindo aroma levemente perfumado de frutas vermelhas conforme indicado pelo fabricante.

No que diz respeito à textura das amostras, observadas macroscopicamente, somente as amostras A3, A4, A5, A6, A7, A8 e P1 apresentaram grumos e arenosidades, e as amostras P1 e P2 possuíam também formação de bolhas de ar.

A avaliação das características organolépticas de uma formulação cosmética é imprescindível, pois geralmente, os aspectos como a textura, o odor e a coloração do produto são examinados antes da sua compra, sendo estes parâmetros importantes do ponto de vista comercial, uma vez que o consumidor pode ser atraído por essas características [17].

Portanto, os ensaios organolépticos realizados permitiram avaliar a integridade física das amostras em estudo e verificar alterações como separação de fase, precipitação e alteração de cor, permitindo a avaliação preliminar da qualidade do produto.

Análise do rótulo

A análise de rótulo foi realizada em todas as dez amostras de cremes alisantes. De acordo com a RDC n° 3 de 2012, é obrigatório conter nos cremes alisantes o aviso de que o produto possui amônia se este apresentar um teor acima de 2% [13]. Sendo assim, em desacordo com tal legislação, a amostra A2, apesar de conter 2,62% de amônia, não apresentava em seu rótulo a informação "contém amônia". Além disso, dentre todas as amostras, A5 chamou mais atenção por estar com o prazo de validade expirado, uma vez que os produtos foram adquiridos em março de 2017 e em seu rótulo apresentava prazo de validade de outubro de 2016. Os produtos fora do prazo de validade são mais favoráveis a causar reações adversas ao consumidor, além de possivelmente serem ineficazes em sua ação devido fatores relacionados à estabilidade dos componentes que depende do tempo de vida de prateleira da formulação. É válido ainda ressaltar que, apesar de não ser uma exigência legal, as amostras A3, A5, A6, P1 e P2 não incluíam as informações de data de fabricação. Adicionalmente, a amostra A3 também não continha o número do lote do fabricante.

As amostras que contém ácido tioglicólico e seus sais devem constar no rótulo as seguintes advertências: nome dos sais de ácido tioglicólico, informações de uso, manter fora do alcance de crianças e uso profissional, caso seja dessa categoria [13]. Todas as amostras analisadas constavam essas advertências em seus rótulos.

Doseamento do ácido tioglicólico, amônia e determinação do pH

O doseamento do ácido tioglicólico e da amônia foram realizados por métodos titulo-métricos, sendo o primeiro classificado como titulação iodométrica direta e o segundo como titulação de neutralização.

A titulação iodométrica direta foi baseada no emprego de solução padronizada de iodo (I2) como titulante e fundamenta-se na a reação de oxidação do grupo tiol do ácido tio-glicólico (HOOC-CH2SH) pelo I2 em meio ácido, segundo equação 3 descrita abaixo:

Durante a titulação é acrescentado a suspensão de amido, essa por sua vez em contato com água adota uma conformidade molecular de α-hélices de amilose, permitindo assim a complexação com a solução de iodo (I2), formando um composto de coloração azul [18].

Já na titulação de neutralização houve a reação entre o ácido sulfúrico (H2SO4), agente titulante, e o hidróxido de amônio (NH4OH), resultando na formação do sulfato de amônio ((NH4)2SO4) e água (H2O), conforme demonstrado pela equação 4 descrita abaixo:

Como o hidróxido de amônio é uma base instável e volátil que se decompõe em NH3 e H2O, a concentração de hidróxido de amônio nas formulações foi determinada indiretamente através do teor de amônia livre (NH3).

Os resultados das análises de teor de ácido tioglicólico, amônia livre e pH estão demonstradas na tabela 3.

Tabela 3: Determinação dos teores das substâncias químicas regulamentadas e pH presentes nos alisantes.

Média de três determinações ± desvio padrão relativo (DPR) ou desvio padrão (DP); A1-A8: amostras de uso geral; P1-P2: amostras de uso profissional.

No que diz respeito à quantificação de ácido tioglicólico, nota-se que cinco das amostras classificadas como de uso geral, isto é, as amostras A1, A3, A5, A6 e A7 estão de acordo com o especificado na Resolução n° 3 de 2012 [13]. Contudo, as demais amostras dessa categoria (A2, A4 e A8) estão em desacordo com a legislação vigente, pois excederam o limite permitido de 8% de ácido tioglicólico. Já as amostras de uso profissional (P1 e P2) foram aprovadas nesse ensaio, pois apresentaram o teor de ácido tioglicólico dentro do limite estabelecido de 11% [13].

Enfatizamos que os produtos reprovados foram adquiridos no mercado varejista, ou seja, estavam à disposição dos consumidores, podendo ser adquiridos e utilizados sem qualquer impedimento ou desconfiança. Sendo assim, torna-se preocupante a segurança dos consumidores, uma vez que quantidades elevadas de ácido tioglicólico podem ocasionar sérios danos à saúde, como efeitos adversos variados que vão desde casos caspa a coceiras, enfraquecimento e quebra dos fios, queimaduras que geram cicatrizes no couro cabeludo, mudança na cor e perda de cabelo [19]. Em concordância com o mencionado, Bárbara & Miyamaru (2008) [20] advertem que os alisantes capilares podem ser nocivos ao consumidor mesmo se utilizados de forma adequada, isso quando apresentam concentrações de ativos acima do limite máximo permitido. Em relação ao teor de amônia livre, todas as amostras (de uso geral e profissional) foram aprovadas, pois estavam dentro do limite máximo de 6% p/p estabelecido na RDC n° 3 de 2012 [13].

A concentração de amônia está intimamente relacionada ao pH da formulação. No entanto, apesar da concentração de amônia em todas as amostras analisadas estar dentro do limite permitido, os valores de pH das dez formulações de alisantes capilares encontram-se fora da faixa permitida que é de 7,0 a 9,5, apresentando valores de pH superiores a 10 [13]. Isso pode ser atribuído à presença de outras substâncias alcanilizantes que podem ser sidas intencionalmente adicionadas nas formulações como adulterantes para aumentarem o poder de alisamento dos produtos.

Apesar de ser um ensaio de qualidade relativamente simples e rápido, a determinação do pH de cremes alisantes é de suma importância, pois o aparecimento de feridas, queimaduras e irritação couro cabeludo são algumas das reações adversas que podem ser provocadas por alisantes com pH fora do aprovado pela legislação [21]. Além disso, o pH extremamente alcalino pode acarretar a quebra e ressecamento demasiado dos fios [3,17]. Em concordância com o encontrado neste trabalho, Souza e colaboradores [22] também relataram desvios de qualidade em cremes alisantes contendo tioglicolato de amônio. Segundo esses autores, 40% das amostras apresentaram pH acima do limite permitido. No entanto, tais autores não discutiram as possíveis causas para essa alteração, bem como não avaliaram as características organolépticas e a conformidade dos rótulos e, principalmente, não apresentaram o ponto de vista químico-farmacêutico envolvido nas reações titulométricas empregadas para a determinação do teor de ácido tioglicólico e amônia livre presente nos cremes alisantes.

Sendo assim, diante dos resultados obtidos e considerando o fato de que os cremes alisantes contendo tioglicolato de amônio são os mais utilizados no Brasil [23] e que, de acordo com Draelos (2000) [3], representam a quinta causa de dermatite alérgica nos Estados Unidos, é imprescindível a realização de testes de controle de qualidade durante o preparo da formulação e uma fiscalização dos mesmo na fase de comercialização, uma vez que são produtos de baixo custo vendidos em diversos estabelecimentos (farmácias, drogarias, lojas de cosméticos, mercados, etc.), não só para os profissionais, como também para a população leiga que, em geral, os utilizam de maneira indiscriminada sem a devida orientação de um profissional qualificado.

CONCLUSÃO

Todas as amostras de cremes alisantes analisadas foram reprovadas nos ensaios de determinação de pH e três das oito amostras classificadas como de uso geral apresentaram teor de ácido tioglicólico acima do limite permitido, ficando evidente a importância de um rigoroso controle de qualidade dessas formulações, uma vez que tais desvios de qualidade podem comprometer não só a eficácia do produto, mas a segurança de quem o utiliza.

Portanto, os dados apresentados neste estudo servem como alerta para as indústrias cosméticas e órgãos fiscalizadores, de que um sistema amplo de cosmetovigilância poderia contribuir com a garantia da qualidade final dos produtos cosméticos, tendo em vista, não só a segurança do consumidor, mas também dos profissionais da área.

REFERÊNCIAS

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Os autores declaram que não há conflito de interesses.
R.A. Sversut, A.D. Ferreira, E.L. Moreira de Toledo, L. Prates-Céspedes, N. Mohamad-Kass ab, J. Cabral-Vieira, Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio, Rev. Colomb. Cienc. Quím. Farm., 46(3), 303318 (2017).

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Adrieli Sversut, R., Delevatti Ferreira, A., Moreira de Toledo, E. L., Prates Céspedes, L., Mohamad Kassab, N. y Cabral Vieira, J. (2017). Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio. Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas, 46(3), 303–318. https://doi.org/10.15446/rcciquifa.v46n3.69460

ACM

[1]
Adrieli Sversut, R., Delevatti Ferreira, A., Moreira de Toledo, E.L., Prates Céspedes, L., Mohamad Kassab, N. y Cabral Vieira, J. 2017. Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio. Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas. 46, 3 (sep. 2017), 303–318. DOI:https://doi.org/10.15446/rcciquifa.v46n3.69460.

ACS

(1)
Adrieli Sversut, R.; Delevatti Ferreira, A.; Moreira de Toledo, E. L.; Prates Céspedes, L.; Mohamad Kassab, N.; Cabral Vieira, J. Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio. Rev. Colomb. Cienc. Quím. Farm. 2017, 46, 303-318.

ABNT

ADRIELI SVERSUT, R.; DELEVATTI FERREIRA, A.; MOREIRA DE TOLEDO, E. L.; PRATES CÉSPEDES, L.; MOHAMAD KASSAB, N.; CABRAL VIEIRA, J. Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio. Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas, [S. l.], v. 46, n. 3, p. 303–318, 2017. DOI: 10.15446/rcciquifa.v46n3.69460. Disponível em: https://revistas.unal.edu.co/index.php/rccquifa/article/view/69460. Acesso em: 23 abr. 2024.

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Adrieli Sversut, Rúbia, Alini Delevatti Ferreira, Eveliny Letícia Moreira de Toledo, Leonardo Prates Céspedes, Nájla Mohamad Kassab, y James Cabral Vieira. 2017. «Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio». Revista Colombiana De Ciencias Químico-Farmacéuticas 46 (3):303-18. https://doi.org/10.15446/rcciquifa.v46n3.69460.

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Adrieli Sversut, R., Delevatti Ferreira, A., Moreira de Toledo, E. L., Prates Céspedes, L., Mohamad Kassab, N. y Cabral Vieira, J. (2017) «Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio», Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas, 46(3), pp. 303–318. doi: 10.15446/rcciquifa.v46n3.69460.

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R. Adrieli Sversut, A. Delevatti Ferreira, E. L. Moreira de Toledo, L. Prates Céspedes, N. Mohamad Kassab, y J. Cabral Vieira, «Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio», Rev. Colomb. Cienc. Quím. Farm., vol. 46, n.º 3, pp. 303–318, sep. 2017.

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Adrieli Sversut, R., A. Delevatti Ferreira, E. L. Moreira de Toledo, L. Prates Céspedes, N. Mohamad Kassab, y J. Cabral Vieira. «Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio». Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas, vol. 46, n.º 3, septiembre de 2017, pp. 303-18, doi:10.15446/rcciquifa.v46n3.69460.

Turabian

Adrieli Sversut, Rúbia, Alini Delevatti Ferreira, Eveliny Letícia Moreira de Toledo, Leonardo Prates Céspedes, Nájla Mohamad Kassab, y James Cabral Vieira. «Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio». Revista Colombiana de Ciencias Químico-Farmacéuticas 46, no. 3 (septiembre 1, 2017): 303–318. Accedido abril 23, 2024. https://revistas.unal.edu.co/index.php/rccquifa/article/view/69460.

Vancouver

1.
Adrieli Sversut R, Delevatti Ferreira A, Moreira de Toledo EL, Prates Céspedes L, Mohamad Kassab N, Cabral Vieira J. Avaliação da qualidade de alisantes capilares contendo tioglicolato de amônio. Rev. Colomb. Cienc. Quím. Farm. [Internet]. 1 de septiembre de 2017 [citado 23 de abril de 2024];46(3):303-18. Disponible en: https://revistas.unal.edu.co/index.php/rccquifa/article/view/69460

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1. Juliana Furtado da Silva Vitola, Geilson Rodrigues Da Silva, Hygor Rodrigues De Oliveira. (2019). AVALIAÇÃO DO TEOR DE FORMALDEÍDO EM AMOSTRAS DE ALISANTES CAPILARES UTILIZADOS EM SALÕES DE BELEZA DE PEDRO GOMES, MS, BRASIL. Infarma - Ciências Farmacêuticas, 31(1), p.28. https://doi.org/10.14450/2318-9312.v31.e1.a2019.pp28-33.

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